quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Um Mero Jogo de Tabuleiro


Já não sei viver a minha vida.
Já não sei jogar na minha vida.
De repente, o meu jogo de tabuleiro começou a ser todo jogado de novo.
Novas posições para os peões, novas para os cavalos, torres, bispos e principalmente para o Rei e para a Rainha.
Esta decisão foi a decisão do poder máximo. Ninguém mais deve regateá-la. É assunto deles.
No início deste 2º jogo, tudo parecia calmo e sereno, a vitória quase que era garantida.
Mas agora... agora que houve peças que já foram jogadas, e peões que já foram perdidos... agora a vitória não está à vista. Os cavalos não sossegam nas suas posições, mas os bispos pedem benevolência. As torres estão ainda um pouca à tona daquela confusão toda, contudo vão sendo as peças mais jogadas e felizmente, até agora, foram sempre bem sucedidas. Se elas pensam também como as outras peças, não importa, importa é que joguem e que vençam !
A torre é uma peça importante. Esta faz parte do castelo do Rei e, desde sempre foi uma técnica de protecção do castelo. As torres deste jogo, são torres vigia que ainda regem grande parte da sua acção com a moral que lhes foi outrora ensinada. Mas não toda !
Elas não falam, mas pensam no silêncio e assistem ao jogo no primeiro balcão. São o elo de ligação entre a Rainha e o Rei.
A Rainha não fala ao Rei nem o Rei à Rainha. Ambos dependem um do outro e dependem das torres também. Todavia, estão tão compenetrados em saírem ambos vitoriosos daquele jogo, um numa posição melhor que o outro, que se esquecem um pouco das torres, que estão lá sempre, aguardando ordens. Nem sempre mal, nem sempre bem... mas estão!
Os bispos vão ficando velhos e querem apenas paz entre Rei e da Rainha e do adversário incógnito que também joga.
Estes bispos são quem muitas das vezes os acolhe e, como têm a vantagem de ter mais idade, ensinam-lhes as técnicas mais adequadas para prosseguir o jogo de cabeça erguida. Existem quatro bispos neste jogo. Dois mais próximos da Rainha, dois mais próximos do Rei. Os bispos apesar de todo o desequilíbrio em que agora o jogo se encontra, falam-se.
Falam com todas as peças, menos com os cavalos.
Os cavalos exuberantes, tentam exibir uma superioridade em relação ao Rei e à Rainha que não têm. Fingem-se parceiros de ambos encurralando-os aos dois, cada um a seu tempo.
Os cavalos agora não falam com a Rainha, pois esta cansou-se de sorrisos falsos e pretende ser verdadeira.
Ela é uma Rainha belíssima, sorridente, simpática para todos os seus súbditos. No entanto, desde há umas jogadas para cá, que tem agido de uma forma fora do habitual. Tem-se mostrado fria, antipática. A luz que irradiava aquela peça branca que sobressaía mais que todas as outras peças do jogo, apagou-se. Ficou uma peça cinzenta, abatida que já não tem vontade de continuar este segundo jogo. Não desabafa com as torres, fala-lhes do essencial e quando precisa de contactar o rei, põe-nas em jogo. As torres sentem a falta da outra Rainha. Todos sentem e reclamam deste novo estado, mas até à data, ainda ninguém jogou de forma a mudar esta situação.
O Rei culpa a Rainha daquela jogada em falso que os fez retomar o jogo do início. Não é antipático como era, ou pelo menos com todas as peças. Parece diferente ou faz-se de diferente, pois no fundo as torres sabem que nada nele mudou.
Continua o mesmo. Dedicado ao jogo como sempre foi. Engenhando truques, jogadas para vencer. O Rei sempre desperdiçou pouco tempo para a rainha e muito menos para a protecção do castelo.
As torres só se lembram que quando tentavam invadir o palácio, apesar de não conseguirem, era provável que acontecesse pois precisavam de ser reconstruídas. Contudo, a culpa era sempre delas, quando o Rei dispunha de um bom material para reconstrução.
Ele não fala a dois bispos nem a alguns peões, mas é a única peça que fala aos cavalos raivosos. E fala porquê ? Porque tal como eles julgam que o enganam, ele julga também que os engana a eles. Jogam portanto neste mundo de aparências, onde o parecer toma o lugar do ser.
Os peões são as peças do jogo que nem são cá nem perdidas nem achadas. Até são, ou eram.. pelo menos antes, quando nem o Rei estava chateado com a Rainha, nem a Rainha com o Rei. Agora... vem-se obrigados ou a jogar de acordo com as ordens dos seus superiores, ou apenas deixam-se perder.
Os peões já não sabem que mais fazer... Não sabem se hão-de jogar se não.
Querem que tudo acabe, como todas as peças querem, mas a única coisa que até agora foi constante foram os ponteiros do relógio, que com a sua musicalidade à base de tic tac’s, acompanham fielmente o jogo...

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Criança


As ruas estão abertas e o meu olhar está perdido. Uma criança escondida espreita com aqueles seus grandes olhos lacrimejantes e observa-me por dentro. Toca no meu eu interior e faz-me reviver o passado, tornando-o, assim, presente.
Ela tem um sorrisinho tímido que, por vezes, com dificuldade o deixa escapar, mas ela nada mais é do que uma criança desamparada, sem alguém que lhe limpe a lágrima que lhe escorre pelo rosto.
Ela, que me observa quando o meu olhar se perde, é quem me atormenta nos sonhos e me faz reviver um passado menos feliz.
É como um espelho que reproduz fielmente a imagem reflectida e mostra-ma de forma aterradora.
Quando ela aparece, eu não sei. Apanha-me de surpresa e envolve-me num ambiente único de memórias recentes misturadas com passadas e nunca, mas nunca felizes. As felizes são nesses momentos esquecidas, postas de parte. Talvez as recorde noutras ocasiões, mas para que possam com os seus braços de ferro lutar contra as infelizes, para que melhorem o meu estado espírito...isso não!
Ouvindo uma música calma e pensativa, relembro, choro e escrevo. Porque é nestas alturas que me sinto inspirada e não há criança mais curiosa que me causa um efeito igual. Tão penetrante... E, de repente, tudo deixa de existir. Deixo de ser importante para todos e, até, para mim. Sou então um ninguém sem nome. E escrevo.
Escrevo linhas, componho frases, completo ideias, formulo pensamentos e obtenho resultados escandalosos.
Que mente tão malévola esta!
Que possui uma habilidade de génio para ser negativista. Para hiperbolizar tudo e desfazer esse tudo num nada.
E como o vento leva o pó leva a criança a minha alegria. Leva-me a alma sem dono, fazendo-me sentir vazia.
Ela está numa ruela bem estreita e escura. Está sozinha. Veio apenas para me atormentar com as suas histórias. Histórias irreais... queria eu. Antes fossem! Ela sabe que não quero recordar, no entanto, obriga-me a fazê-lo. Diz que tenho que abrir tanto os braços ao passado como abro ao futuro. E pensar nele com o mesmo positivismo.
Ansiá-lo, querê-lo de volta... todo ele. Mas não quero, não quero aquilo que não me trouxe felicidade.
Não quero ressuscitar qualquer palavra que foi para mim uma faca bem afiada.
Quero abandonar esse tipo de pensamento e sofrer. Aguardar pelo fim se o há.
A criança malévola não se vai embora, quer-me ver sofrer.
Alimenta-se disso. Eu deixo, deixo que ela leve tudo de mim. Deixo de pensar que existo... Deixo de pensar em mim...

E num outro dia, perco meu olhar num baloiço.
A minha querida criança vem-me visitar, sorrindo... sorrindo por me ver!
Pega-me na mão direita, aponta-a para o céu e com as suas dóceis palavras diz-me: “O céu é infinito. Tal como todos os teus sonhos o são. O meu céu não tem limites e o teu... o teu também não.”
Tal como uma criança que ainda é, desapareceu cantarolando. E eu ali parada fiquei. Olhei de novo para o céu. E, envolvida naquela variedade de cores e de luz que me encandeava, vejo esse infinito. Obsrevo-o e vejo que, depois de uma enorme tempestade, o sol exuberante vem mostrar toda a sua grandeza. Afasta todos os medos e espalha alegria, mesmo onde parece que já não a há.
Sorri.
E quando dei por mim, apercebi-me que nenhuma tristeza eu sentia naquele momento, estava como que extasiada por toda aquela luz toda. Que, repentinamente, trouxe todas as esperanças e a minha cabeça fechada na solidão, expandiu-se!
“Desperto” do meu outro mundo e prossigo o meu caminho de regresso a casa.
Mas havia algo que ecoava constantemente dentro de mim, da minha cabeça. Todas as minhas esperanças que regressaram, transformaram um Tudo num Possível, onde o Impossível não tem lugar. E, por isso, eu não consegui esconder toda essa minha felicidade por estar ali naquele momento, por estar viva. E repetidas vezes disse para mim mesma: “Eu sou capaz!”

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Sem nome



Às vezes quero mudar de nome. Quero olhar em volta e não ser eu.
Este meu nome que me acompanha desde sempre, que é símbolo da minha identidade. Este meu nome que me diz quem sou... às vezes era tão melhor não dizer...
Quero ser eu e não quero.
Não quero ter imperfeições, não gosto que mas apontem. Quero ser perfeita e não quero. Não acredito que haja alguém perfeito, mas sim que haja uma ideia de perfeição idealizada por nós, seres pensantes.
Estas contrariedades atormentam o meu pensamento e há dias em que não as aguento. É nessas alturas que prefiro não ter nome.
Passar pela multidão, ser todos e não ser ninguém.
É necessitar de passar pela rua sem encontrar uma cara conhecida. É ansiar por estar num lugar distante de todos os que nos ligam a este lugar onde vivemos e, aos desconhecidos... a esses, seria apenas indiferente.
Parece estranho pensar desta forma que eu julgo que não é a mais correcta. E continuo a pensar que não é. Mas por outro lado, parece que preciso de me sentir assim... preciso de ficar triste e de pensar na vida para que as ideias fluam naturalmente como dantes.
Como escrevi no texto anterior, são os outros que nos dizem quem somos, e nós apenas vivemos com essa ideia e com uma outra mais pequena que é a que nós temos de nós próprios. Assim sendo, as palavras que os outros nos dizem magoam-nos muito mais que as nossas a nós mesmos. E, por isso, apesar de tentarmos combater essas palavras tentando sempre encontrar exemplos de experiências que já vivemos que comprovem a falsidade de tais juízos, às vezes a força é algo que nos escapa. Acabando assim, por não lutar por nós. Entregando de forma cobarde e cobrindo o rosto de lágrimas, a razão de mão beijada aos outros.
Mostramos a parte fraca e desejamos não ser ninguém. Desejamos nem nome ter. Esse que nos caracteriza e que nos diz que somos alguém mesmo quando não queremos ser.
Sabemos que não é isso que realmente pensamos em que queremos, mas sim o que nos “apetece”. Estes “apetites” revelam que nem sempre somos suficientemente fortes para pensarmos exclusivamente com a cabeça ou mais com ela, mas sim que pensamos, nestas alturas, muito mais com os sentimentos. O nosso pensar funciona apenas em função daquilo que sentimos, procurando episódios da nossa vida que justifiquem tais sentimentos.
E nós nunca, mas nunca quando estamos quase que estagnados no tempo, invadidos unicamente por ideias negativas, pensamos primeiro se estamos a pensar bem ou mal, se é certo ou errado aquilo que pensamos. Ou se pensamos, não queremos pensá-lo pois por vezes precisamos de nos sentir angustiados, tristes e indiferentes à vida.

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Ideias vagas, pensamentos expostos



Há dias em que penso em mim, mas não só em mim. Na minha relação com a vida, com tudo o que me rodeia. E sinto-me miseravelmente pequena.
Olho em volta como se fosse outro a olhar-me. Outro que não eu.
Olho em volta e tudo parece tão complexo, tão difícil que tenho vontade de desistir e dizer que não consigo. Mas só o facto de ali estar me atormenta. Ali, no meio de tanta gente. A outra pessoa que me observa não me distingue dos outros. O observador apenas sabe que não quer ser como nós, porque pensa que não conseguiria viver assim.
Penso que por vezes olhamos para os outros e pensamos que não conseguiríamos viver daquela maneira, mas quem disse que a nossa maneira era fácil?
O próprio observador desconhece a complexidade da sua própria vida. E, por isso, considera a sua mais simples, mesmo tendo tantos problemas, menos ou mais que os outros.
Nós, humanos, temos muito este hábito de não "olhar para o nosso umbigo", mas para o do vizinho. Sensibilizando-nos com os problemas de outra gente e disponibilizando-nos para a ajudar. Assim, fechamos muitas das vezes os olhos para os problemas que começam no nosso seio familiar e tentamos, em vez de arranjar soluções, desculparmo-nos. Algo que é bastante comum neste mundo fútil e interessado (não nos outros, em si e no seu bem-estar).
Penso e quero continuar a pensar que certos e determinados seres pensantes fogem a essa regra, ou quebram-na, mas apenas à tona. Isto é, não é pelo facto de nem sempre ajudarmos em campanhas que ajudam os necessitados, por exemplo, que vamos passar a ser desinteressados em relação aos seus problemas. Não, porque não somos. Ou nem todos são. Apenas uns não podem, outros não têm tempo, entre tantas outras desculpas que arranjamos e que se pensarmos bem nelas, afinal têm pés e cabeças. Têm, e porquê?
Porque dependemos das nossas desculpas, sejam elas verdadeiras desculpas, coisas que não podemos ou conseguimos contornar; ou desculpas no sentido que geralmente utilizamos, no sentido de pretexto para não fazermos algo de que não temos vontade, ficando sempre cima. (SALVO SEJA !)
Como este, encontramos vários assuntos/problemas que nos fazem pensar e repensar certas atitudes que tomamos e, ao tentar justificá-las, tentamos de certa forma, conhecer-nos. Descobrir o que somos sem ser apenas pelo que os outros dizem que somos, tentando ter uma opinião formada a nosso respeito minimamente coerente.
Eu pelo menos sou assim. E, inúmeras vezes tento por-me na posição de outro que não eu e ser o observador desconhecido que apenas visiona a minha vida como tantas outras. Sensível aos meus problemas, mas não aos dele... E então questiono-me sobre quem é que eu sou? Como sou? Porque eu quero saber, quero descobrir! Mesmo que por um lado pense que os meus juízos de mim nunca serão os mais acertados... Isto porque, infelizmente, (e isto é um mal geral) todos sabemos que temos defeitos, uma vez que não há ninguém perfeito, mas o problema está em que ninguém aceita os defeitos que tem ou todos os que tem. Não conheço ninguém que aceite, mesmo que diga que sim e que se mentalize que sim, a pessoa nunca aceita todos os seus defeitos porque há-de haver sempre aqueles com que não concorda e, por isso, é que por vezes toma as atitudes que toma. O que quero dizer com isto tudo é que eu nem sempre me sei definir e, tal como tantos outros, arranjo forma de o tentar fazer, nem que seja só para me contentar com essa definição por mim encontrada. O que é certo, é que tal como tenho dito ao longo do texto e continuo a insistir nesta ideia, é que eu não me sei definir a mim, por todas as razões que já apresentei, mas eu sei definir os outros! E é essa minha definição, juntamente com muitas outras mais, que o outro vive, contentando-se com o pouco que conhece de si, sendo grande parte desse conhecimento, o meu conhecimento dele.