domingo, 30 de agosto de 2009

Ironia da Vida


A ironia da vida. As suas cambalhotas, as suas danças tão bem sincronizadas cujo ritmo não me acerta e as minhas pernas parecem já flácidas como o tempo que me resta.
O sempre é a maior utopia.
O amor é a maior mentira.
A verdade permanece escondida e quem me dera a mim encontrá-la.
Os seus pântanos foram-me selados e eu cancelei, assim, todos os sonhos que te envolviam.
Ou queria eu tê-lo feito e, sem êxito, então, caminho.
Continuo à procura do meu caminho, do meu complemento, da minha razão de sentir, mas sinto que me foge. Faz de propósito quer que entre na sua jogada, maldosa e dolente, enquanto me mente e me faz sonhar com o que impossível.
A música mudou e eu já não sei dançá-la. Faz a sua ginástica e faz por que eu dela parte não faça e fique excluída e completamente sozinha.
Os sonhos são, de facto, meras utopias. São a minha perdição. São a minha morte.
Enfio lá a minha cabeça oca e surpreendo-me com o que é messiânico.
Os meus passos são compassos e já de nada servem. Dançam feitos loucos na pureza da loucura.
São frágeis e pouco concisos, estão doidos e desaprenderam todas as lições, todos os ensinamentos, toda a teoria, são mais livres e estão fora de si, choram fingindo ser por simpatia ao cavaquinho.
Até os instrumentos me rejeitam o corpo e a alma já não sabe das suas cordas vitais.
Sinto o meu espírito demasiado morto e o meu corpo fatigado, saturado, cansado, sem saber sequer se é.
E eu, sou?
Finjo saber, mas na verdade não sei.
Já suplico a qualquer força divina onde as minhas crenças não residem, mas que, no meio deste desespero as ressuscito, que me não te façam amar.
Eu não posso sentir amor.
Porque é só a mim quem eu vou enganar.

Fealdade

Errei.
Errei quando acreditei nas tuas palavras. Errei quando acreditei nos teus gestos. Errei quando me considerei importante.
O vento tudo leva. E levou-me a mim para longe de ti, só porque não consegues discernir atitudes e nasceste cego pela vingança.
És um assassino no que toca às minhas emoções. Custa-me crer que para ti sou apenas alguém que libertou essa tua vontade de pisar uma ingénua amante que acreditou nas tuas promessas vãs e tão precárias.
Como fui estúpida.
Abdiquei do meu egoísmo, de muitos dos meus defeitos só para te ver sorrir.
Não vejo qualquer ponte porque valha a pena atravessar.
Os teus objectivos prevalecem por entre o que mais me fere.
E ferida por ferida, prefiro ficar longe da tua espada.
Como pudeste, sequer, espetá-la se te tentei sempre dar o melhor de mim? Por que é que escolhes ficar mal se podes ficar bem? Por que é que não pensas?
Alguém tão crítico, tão bom conselheiro consegue ser tão incrivelmente egocêntrico e dogmático, com a filosofia do “doa a quem doer, a mim dói-me menos”…
Espero que estejas contente e que cedo tropeces na tua própria encruzilhada para que com estas atitudes erróneas possas crescer e fortalecer-te.
Por agora és apenas demasiado fraco. Tudo te deita ao chão e não te sabes levantar. Demasiado apegado a si próprio, tens muito que saber. Coisas que também me custaram para poder dizer hoje que sei de mim e o que quero.
Se me queres longe da tua estrada, então essa será a última vontade que te concedo.
Caminharei no sentido inverso ao teu e não olharei para trás.
Surpreendeste-me, conseguiste tornar-te feio.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Cidade/Homogeneidade

Cheira a cidade. Oiço as buzinas barulhentas e impacientes. Quase que me chega o vapor expelido pelos automóveis e, até, o fervor da decadência em que se encontram os próprios condutores.
Os meus vizinhos fazem das suas janelas e varandas locais sociais e divulgam entre si inúmeros pensares. Oiço talheres e armários a bater, um cão a ladrar, vozes dóceis e jovens que riem, sinto a rotina de uma rua grande toda da minha simples e modesta janela.
Não estou curiosa por saber o que escondem tantos vidros apenas gosto de me sentar e sentir a vida neste meu recanto.
Posso alegar que me acalma. Talvez seja uma das minhas variadas evasões, pelo menos é menor o tempo que gasto a pensar em mim.
Às vezes canto. Às vezes danço. Às vezes rezo para que, tal como eu estou às vezes atenta, os meus vizinhos não estejam.
Penso como era bom se me pudesse evadir sem ninguém me ver, ouvir ou sentir e penso quantos o mesmo não quererão.
Por muito mal que cante, dance, pinte… faço-o porque me sinto eu mesma. Sinto-me liberta, livre, abraçada ao meu próprio ego, enamorada com a minha maneira de ser.
Nem sempre tenho destes momentos pessoais por isso mesmo, considero-os fulcrais para o meu bem-estar.
Todavia, sinto-me tantas vezes observada, a ser escutada como se alguém soubesse destas minhas fugas e estivesse ali, de cotovelo apoiado na janela, com a mão desse mesmo braço a segurar a cabeça de um rosto cansado e triste, envelhecido pelo seu estado social, a espiar e a criticar esta minha maneira de ser tão oposta e fugida ao conceito pelo qual todos nesta sociedade se regem, o da Homogeneidade.
Será errado sair da minha carapaça só para dançar com as poucas bases que tenho uma música com a coreografia que, por muito louca que se demonstre, seja para mim a mais sentida?
Será errado cantar por gosto?
Será errado pensar se é errado para evitar ser contaminada pela generalidade da qual todos bebem e sem recalcitrar? Será errado procurar a minha heteronomia, a minha anomalia? Estarei a tornar-me, deste modo, inconveniente ou a atrasar o meu crescimento psicológico ou estarei eu mais próxima da lucidez que tantos anseiam?
É este difuso e complexo bombardeamento que me faz erguer a cabeça e caminhar em direcção à minha tão querida janela duplamente envidraçada, que me mostra abertamente a minha cidade. Respiro já duma brisa nocturna tão fresca e saborosa.
Não vem sozinha, faz-se acompanhar de condimentos especiais – um céu estrelado e uma lua sempre perfeita. A minha paisagem favorita é tão simples e, simultaneamente, excessivamente arrebatadora.
E, sem carecer de qualquer tipo de energia eléctrica, durmo sobre a bela luz, noctívaga e sem artifícios, que me alumia os sonhos.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Loucura


“Bato a porta de vagar, olho só mais uma vez, como é tão bonita esta avenida.”
Talvez esteja a exagerar e, por isso mesmo, seja menos querida, talvez queira ser tão bonita quanto é esta avenida.

Não sei. Talvez. Atacou-me o cepticismo profundo. Não consigo sair daqui. Quero, mas não consigo não pensar em ti.
Quero não pensar, mas não consigo. Quero não sentir, mas não consigo.
Distracções já não elevam pensamentos e os pensamentos fazem força para permanecer exactamente onde os não queria.

Quero pensar menos em ti, mas não consigo. Não percebo… por quê?
Se tu consegues deveria ser fácil e simples! Deveria conseguir não sentir saudade.

Porque eu sinto SAUDADE!
E tu não, ou pelo menos consegues moderá-la, desviar-te dela, não pensar em mim. Já eu, que tanto o pretendo, não consigo.
Quantas mais noites em claro tenho que passar para desistires de invadir os meus sonhos e impedires-me percorrer as minhas próprias loucuras neles, onde posso realmente ser quem eu quiser.
Por que é que tens que dominar todos eles? Já não chega o tempo que passas na minha cabeça quando estou acordada?
Será pela quantidade de dias, de horas?
Eu conto o tempo para te ver, para te falar…

Estarei louca? Devo estar.
Se te contasse provavelmente sentir-te-ias grande, mas sentir-te-ias na obrigação de te afastar.
Sim, eu psico-analiso tudo. Não sei se existe, mas não importa. Talvez te afaste desta minha entediosa maneira, mas não o consigo evitar.
Se não pensas tanto em mim, então deixa-me também não pensar em ti também.
A mim parece-me justo.

Isto corrói-me por dentro. Devo ser louca. Só posso estar louca.
Por favor, diz-me que isto é só loucura.


segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Ausência de Cor


Pediram-me para molhar os pés na água salgada só para dar uma espreitadela nos modestos azuis do mar, tão ímpares, tão únicos, tão cansados.
Quiseram que nesse momento fugaz eu o preenche-se com as cores que me definem, como se fosse o acto mais simples do mundo.
Mas eu tenho tantas cores, quais usar de momento?
Teriam que ser as melhores, as perfeitas, as únicas, as que não detenho agora em evidência.
Como corresponder a tal pedido se não tenho, sequer, cores para me pintar?
Uma cor qualquer serve. Já não ligo. Não tem importância se estou amarela ou encarnada se me sinto sempre dentro da mesma tonalidade, um ténue cinza.
Não, não é um cinzento de tristeza profunda, nada disso. É apenas um cinza sublime, ligeiro de quem levanta a sua tão bem guardada bandeira branca e a ergue, exaltando todas as suas fraquezas com a maior das suas forças.
E não é nenhuma tentativa de arranjar desculpas é só que nem os meus lápis de cor tem qualquer outro tom se não neutro e muito menos o terei eu.
Talvez a minha visão também já não abrace de igual forma as cores, aquelas que nos fazem vibrar e sentir seja aquilo que for. Logo eu que sinto que tanto sinto.
Talvez esteja doente por sentir demais, por ser demasiado sensível. É estranho partilhar um mundo com espécies tão díspares entre si, tão dissemelhantes de mim.
Será que existe cura, será que de tantas e tantas vezes que este mar me salgou os pés, me trará desta vez alguma resposta?
Será ele o meu pintor favorito, não desfazendo a minha tremenda admiração por Leonardo, mas não poderá ele deixar uma cor em mim? Uma cor qualquer, uma diferente. Uma que nos una só para eu não me sentir tão igual à multidão que se apressa e tão diferente na minha Interioridade ao ponto de não a conseguir comunicar para partilhar.
As palavras não chegam para me exprimir e tantas vezes o simples bater do vento na minha face queimada afasta tantos males, corre com os maus presságios e deixa-me limpa, sentindo-me como que isenta de imperfeições, entregue àquele momento, ali, completamente rendida, sua. “Leva-me” – digo-lhe sem emitir qualquer som, sem necessitar de qualquer vocábulo, desenho apenas um leve sorriso no rosto.
Como posso explicar a minha admiração pelo banal, pelo que é grosseiro por ser rotineiro, pelo que não é bonito? Como hei-de me colorir?
Gosto, claro, da minha dessincronização com o mundo todo, mas acabo sozinha, sem palavras, nem gente, sem cores, nem mar, sem sensações, nem vontade, diferente, mas igual a toda a gente e com os pés molhados...