domingo, 27 de setembro de 2009

O resgate: dança

Folia. Eu ria, enquanto te abraçava, enquanto dançava ao som de cada palavra que nos unia as bocas e, nos entretantos, tal não era o embale que eu já mal dele fale, que me deixou ficar assim, perdida.
As tuas palavras estão presas, perras mesmo, custam a sair e, quando saem, mostram-se com a cabecinha de fora, de olhos arregalados, como quem é empurrado para fora donde não quer sair.
De tanta lágrima vertida, de tantas outras enxugadas, algum desse choro teria que ser benigno e, fazendo juz à sua promessa, aqui me tens transformada.
Olha-me bem, com os teus dois grandes olhos castanhos. Vê este meu agora mudado, cheirando a determinação, a crença nas suas capacidades que derrota completamente o eu passado.
Talvez uns belos passitos de dança tenham ajudado ao que tudo se resume numa questão de confiança.
Que se deixe de lado a inveja de quem é aquilo que outros desejam. Sou uma boa bailarina e a dança a mim nunca falhou. Nela deposito todo o meu amor e rezo veemente para que nunca me deixe, para que nunca me abandone. Os meus passos são compassos e a minha vida toda é o enorme chão de dança.
Tenho a cabeça cheia e preciso de libertar movimentos, angústias concentradas, pensar num eu ali, naquele meu momento, pois tudo o resto que tomo como verdadeiro descobre-se que, no fim, é fachada.
A pouco e pouco, vou conseguindo me desfazer das emoções mais arrebatadoras e levar uma vida estável na base do sentimento q.b. De certo que o heterónimo Ricardo Reis fosse de todos o mais sagaz, pois acima de tudo procurou uma vida assim. Toda atracção e deslumbramento que senti por Alberto Caeiro não me trouxe nada de positivo, a nossa semelhança acarretou o sal todo que guardo. Penso portanto que é a nossa dissemelhante que me mostrará a direcção da bem-aventurança.
Deveria, assim, procurar o caminho dos epicuristas e estóicos, como fez o primeiro heterónimo que referi.
A verdade é que não quero ser tão linear apenas gosto de colocar algumas das suas bases como contrafortes na estrutura da minha vida. E se assim o sou, foi por opção porque sou livre de escolher a atitude que pretendo tomar, mas também estou condicionada à mesma, porque se não escolher mudar então sou masoquista porque ando num ambiente circular onde a confiança nos outros acaba por nós magoar se formos demasiado emotivos como eu o sou.
Assim, eu sou livre de escolher a opção que mais me convém porque existe sempre outra. Como Sartre afirmou e bem, “nós estamos condicionados à liberdade”. Assim sendo, vou optar não pelo que quero – pois o quero é permanecer imutável e feliz, numa felicidade que não é só momentânea – , mas pelo que me trará um felicidade mais duradoura por muito que custe o agora.
Como defende Fernando Savater em “Ética para um Jovem” a partir de uma história do Génesis – o primeiro livro da Bíblia –, sobre dois irmãos, Esaú e Jacob, o primeiro, detinha o direito de primogenitura. O irmão, que lhe cobiçava o lugar, resolveu um dia confeccionar um guisado de lentilhas ao qual Esáu não conseguiu resistir. Ora, nesta situação a conversa mantém-se, pois havia nas lentilhas o senão que era o de Esaú poder refastelar-se no preparado, mas ter que em troca conceder a Jacob o direito de primogenitura. Esáu, obcecado pela tentação pensou apenas naquilo que lhe traria uma felicidade instantânea, imensa até, e não duradoura. Claro está, que quando se arrependeu era, na verdade, tarde demais. Apesar de aqui também estar em causa a imensa importância que Esaú atribuía à morte, vivendo com a filosofia de que já nada vale a pena.
Podem então objectar-me que não era o que eu há pouco defendia? A consciência da morte, o viver com emoções moderadas, entre outras? De facto o disse, mas também disse que procuro uma felicidade duradoura e não apenas com base num guisado de lentilhas. Assim sendo, a consciência da morte é para mim relevante e importante, mas não ao ponto de tudo valer o mesmo, apenas quero refugiar-me numa vida leviana onde os sentimentos são controlados, com o único objectivo de não sofrer.
Assim, com este exemplo reforço o meu argumento de que o importante não é lutar por uma felicidade cómoda mas precária, é sim lutar por uma felicidade o mais duradoura possível.
Como? Mudando já hoje o meu modo de agir, de estar, de comunicar, de ser com os outros.
A dança preenche, ainda que não totalmente, o meu vazio, a minha necessidade de sentir excessivamente. E por isso ela é tão importante e tem tanta presença em mim.
Quero dançar nas melodias e não sentir o hoje nem o amanhã. Quebro aqui a parte de não ser tão emotiva, mas como disse, apenas procuro filiar-me nos princípios de Ricardo Reis, não pretendo ser como ele. É apenas uma óptima inspiração. Assim como Caeiro, mas dessa forma eu comecei a passar de pessoa a objecto e a esquecer-me de me dar e de me darem a mim.
Deste modo, alego que já estive dilacerada, mas que hoje visto um fato novo.

Encostada


Mergulho nos meus medos, confiante de que todos se evadem num borbulhar inoportuno.
Os meus pensares emergem e quase que se encontram prontos a dispersar. Ergo, vazia e leve, a cabeça, abro os olhos com o coração esperançado e… ainda ali estou, precisamente no mesmo sítio, rodeada pelos mesmos objectos inanimados, exactamente com os mesmos problemas. Parece que o sonhar nada muda, o mergulhar nada esquece, atenua apenas a incontrolável vontade de me ser tão longe daqui.
Sinto-me cansada. De mim tudo levam e para mim, nada meu me resta.
Estou só e malamada. Parece que afinal até me serve este epíteto. Se calhar estavam todos correctos e eu errada. O melhor é mesmo prosseguir as minhas passadas sozinha.
Agora que vou reconstruir um dos meus sonhos, posso dançar nas minhas angústias e esquecer por momentos tudo e todos que me ferem.
Ninguém aceita nem gosta, mas eu sei que vou ser tão eu ali.
E aquele chão meu ninguém o pode tirar.
Só por cima do meu cadáver mo poderão negar.
Não abras os olhos enquanto o tempo urge e vê-me, então, depois a sair por aquela porta que jamais atrás volta.
Ela já está encostada, eu luto, mas parece que já sabe o que me espera.


sexta-feira, 18 de setembro de 2009

O Teu Silêncio

Sou uma boa confidente e quando não são só as paredes que me ouvem, penduram-se-me as palavras. Fico perante um enorme silêncio, cortante, indefinido, enigmático, impenetrável, fechado.
Da sua chave me desfiz e não há ruído que rompa o silêncio.
Talvez a guitarra, talvez o fado.
Não quero, não obstante, usufruir daquilo que não deve ser pronunciado.
É submisso, deverá não ser falado.
Então não sei porque não ser ler o silêncio. Antes fosse da ronquidão das palavras ou do desgaste do seu constante mau uso, mas é a abstinência da fala, o sossego desassossegado e perturbante, é veneno.
É tormento.
Sinto saudade. Saudade é palavra e sabe tão bem proferi-la sem receio.
Quebra o silêncio, confessar não é vergonha. É descargo de consciência, é partilha de experiências, é quebra na monotonia, é motivo de tristeza ou alegria, é um sinal pautado de verdade.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Segredo


Por entre segredos confesso que acho que te amo.
Sei que deveria ser uma certeza, mas, se o fosse, implicaria que te teria de contar e, como sei que só de minha parte o é, prefiro permanecer numa atitude céptica com as minhas indagações pessoais.
Nesta minha introspecção avalio tudo. Cada sensação.
És uma pessoa tão cheia. É impossível não sentir o que sinto, não saber ouvir-te, não te saber ver ou sentir.
És tão grande que não sei se tenho altura que chegue para te beijar a face.
Sou pequena e tenho uma fraca figura. Sou, apesar de tudo, forte.
Sou dotada de muitas qualidades e, também, muitos defeitos. Claro está, que não sou eu que os enumero, pois são os outros que me podem dizer quem sou e o que sou, por entre vários juízos pessoais, são eles também formadores do meu eu.
Penso que se me conhecesses melhor, não te arrependerias.
Eu quero conhecer-te, é como uma necessidade biológica, como uma sede insaciável, porque tudo em ti tem um aroma a loucura, a proibição, a fatalismo.
Perco-me em ti. Não me importo. És como um labirinto, confuso e detalhado, do qual não pretendo encontrar a saída.
As tuas palavras beijam-me, os teus gestos enlaçam-me e não preciso de mais nada.
Preciso apenas que vejas isso.
Eu já achei a minha verdade. Isto é, penso que achei.
Não te digo, é segredo. É o meu segredo. Logo saberás se fizeres por merecê-lo.
Não percebes que é só isso? Só preciso que te deixes levar pela loucura, já que te dizes também apaixonado.
Mostra-o!
Se sou mais, se me queres deixar ser, larga o passado e dá-me aquilo que eu mereço.
Sou tua.
Infantilmente tua.
Agarra-me com toda a tua força e por favor não me largues. Tenho tanto medo de cair.





Vazio

Chega de ilusões.
Chega de maus presságios. Se há boa coisa que aprendi foi a não caminhar para o Nada onde nada posso obter. Nem uma sincera e simples emoção.
“Não vás por onde não pertences” – se não foi ainda dita por um sábio qualquer, deveria. Uso-a eu de momento pois o meu coração é pequeno e demasiado frágil, não pode com o mundo todo.
Sou uma ínfima parte, mas sou-o com orgulho nos melhores dias.
Nestes, luto apenas contra a tristeza que me invade com a triste verdade.
Como dói. Dói demasiado.
Sou TÃO tonta, meu Deus. Como pude deixar chegar a este ponto.
Tenho tanto medo e não há palmadinha nas costas que me valha. Estou apaixonada e sozinha. Tal aberração não deveria ser permitido. E a quem multar?
A mim. A mim por sentir.
Tira-me, por favor, todas as emoções.
Mais nada te peço.
Estou tão cansada.
Tenho já a cara desfeita por entre as lágrimas que me ocupam a tez queimada.
Tenho o coração mole e demasiado esmigalhado.
Será assim tão difícil gostar de alguém que goste realmente de nós?
Tenho vergonha de mim, quando devia exaltar-me.
Sou tanta coisa e sinto que não sou nada se o não for para ti.
Será justo? Penso que não.
Às vezes o ler alguns pensamentos poderia apaziguar ao menos o meu estado espírito com a crua e despida verdade.
Vem roubar-me a inocência, vem dilacerar-me, vem com emoções fracas enquanto eu te dou cada bocado de mim, só para que nunca nada meu te falte.
Se te fores embora, levas-me contigo.
E a mim de ti, predominará a saudade, e a mim de mim, o vazio pois tudo o resto levaste.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Semente


Talvez não mereça palavras. Que se troquem então as locuções que não passaram de meras ilusões e que agora são-me tão amadas.
É talvez um acto penoso todo este negativismo. Colhe-se aquilo que se semeia e, mesmo aquilo que prevalece ainda como semente, logo se transforma e cresce tão perfeito, tão completo.
Julgo haver aqui um mau uso de vocabulário por entre tanto outro já em desuso, esqueço-me dos valores.

Do valor de cada coisa, de cada semente plantada.

E talvez seja o fervor que me deixa meio atarantada sem saber bem pensar nem ver o grande que está e sempre esteve bem diante dos meus grandes olhos castanhos.

As percepções clarificaram-se e sinto-me submersa num tremendo estado de pureza.

Vejo beleza em tudo o que me rodeia e já nem o mal tanto me atormenta.

Foi plantada subtilmente uma semente e eis que cresce e floresce e…

E tenho um sorriso vencedor, forte, delineado e tenaz, construído com forças naturais tão apaziguadoras, especiais e impulsivas. Distingo-as pela sua diferença, pela sua singularidade, pelo sentimento que me causa, pelas poucas palavras que me faz dizer acompanhadas por todo um sentimentalismo ritmado pelo forte e apressado bater do coração.

É tão inocente. Tão frágil. Tão puro.
Desculpa-se dizendo por meio de batidas ofegantes, que apenas alimenta aquilo que tão perfeitamente semeaste.


P.S.: Imagem retirada do google.

Sinto-te


Por muito que eu queira não consigo esconder, disfarçar ou negar a tremenda presença que tens mim.
Não importa quantas lágrimas são vertidas se contigo tudo é tão perfeito.
E não, não me sinto capaz de te dar razão em tantas tolices tuas, mas é que hoje só me apetece sorrir.
Está tão claro o dia. Está tão aberto o meu olhar e sinto uma sensação de pureza a atravessar-me o corpo, é quase que incontrolável e é tão fresco, tão novo, é tão positivo.
Deixo-me levar. Parece saber, bem melhor o que eu, para onde me leva.
Não tenho medo.
Sinto-me tão livre.
Capaz de tudo.
Vou voar.
Voa comigo.


Sinto-te.

P.S.: Fotografia de Nelson Martins.

Mar


O mar. Eu disse que ia ouvir o mar e não o fui ouvir. Pensei ingenuamente que tão poucas palavras far-me-iam sorrir por tanto tempo.
Precipitei-me. Ainda não é tempo de entregas é, antes, tempo de pé atrás, de fazer cada jogada o mais deliberada possível para ser a mais acertada.

Não ouvi o mar quando ele me quis segredar. Regozijei-me nele, usei-o e embora me fui. Nem para trás olhei. Nem me despedi. Ainda aqui impera a saudade.
E é só a saudade que me resta.

Saudade.

Vou desprender-me de ti.
Talvez seja o mais acertado, ainda que seja o mais distante de mim.

Talvez já o esteja sem que o tenha notado.

Talvez muita coisa não resolva coisa nenhuma.

As palavras não fazem sentido e a vontade escorrega-me da mão. Não sei o que quero se não sou querida ou se não o sinto.
É, então, indiferente se me o mar me canta e encanta, se dança comigo e se é o meu único par, se me beija com os seus lábios salgados ou se é o meu único amante, se continuo com o véu que me cobre e me esconde de todo o mundo e de ti.

Será que ainda vais perceber o quanto te quero?

Ou será que terás apenas essa mesma percepção, mas nunca o mesmo sentimento?

Gostava de invadir sonhos teus e ser um dia quem desejas. Mas de verdade. E não apenas alguém que nos faz sentir bem connosco próprios, que nos acaricia o ego e nos faz sentir importantes.

Quero que saibas que estou aqui, mas não quero que te sirva isso de bengala.

Não quero que envelheças nessa certeza, por muito certa que seja.

Sinto-te tanto em mim que se soubesse que não caia era a pessoa mais feliz do mundo, só por saber que estás comigo por razões que só tu sabes.

Sou perfeccionista e não me contento com um sentir bem, quero ser realmente importante, porque tu já o és e eu… Eu sei que não o sou, e estou longe de roubar esse lugar a quem já o conquistou.

P.S.: Fotografia da minha autoria.