segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Perdida

São estradas, moradias, ruas encobertas.
Não se avista o sol ou qualquer ínfima luminosidade, a noite asfixia a vida.
São paredes incompletas, desfeitas, dilaceradas que fazem jorrar sangue de outrem. Tijolos amargurados finalizam objectivos de tempos outros e é a poeira quem lá habita.
Deixada a céu aberto para que este lhe conceda a sua sina, os fortes ventos plantas várias erguem como pássaros audazes em voos rasantes. Estas encontram o seu novo leito desenraizado da sua obra-prima original, nestas ruínas anónimas, sardónicas e temerárias. Pedaços de nada, anulados perante tudo aquilo que respira. Não assumem qualquer posição nem têm qualquer vontade.
São tudo de um Nada. Perdidos.
Por essa degradação os meus pés me indicaram o caminho como se o corpo e a mente estivessem por breves momentos desligados, dissociados e conversassem em línguas antagónicas e incognoscíveis. Dei por mim como sendo cada racha das paredes já desfiguradas, cada tijolo que da sua naturalidade se desencontrou, cada pó dantes soprado. Dei por mim enclausurada nesse retiro. Dei-me como uma ruína, anónima e perdida de tudo e de mim.

P.S.: Fotografia de Nelson Martins e edição da minha autoria.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

São Só Palavras

Não consigo escrever.
Estou tão cansada de tudo e tão fraca que não quero lutar por nada.
Penso que não existe amor ou qualquer coisa com tal ignóbil sentido. Parece que não lhe sabem dar o devido valor, ou poucos sabem. Gostava que alguém no mundo pudesse compreender o meu pensamento para me sentir menos estrangeira e viver mais humanamente. Todavia, tudo o que vejo de humano tem valores corrompidos e corrosivos. Deles quero distância.
Tenho vergonha daquilo que sou pois os meus princípios parecem e permanecem, para muitos, risíveis. Talvez seja ingénua por pensar que há então valores, que no mundo existe algo de bom e colorido que me faz querer ser mais e mais nele.
Mas esse sonhar que me envolve, que me cega e constrói nessa utopia, rasga-me por dentro. Deteriora-me. Esfola-se-me na pele. Deixa-me num estado deplorável capaz de nada.
Sou sensível e inutilmente cedo a qualquer afecto. Parece burlesco. Que ser idiota. Sou capaz de me entregar se me cantam numa canção simples que demonstra superficialmente a minha essência. Já devia saber o que são as palavras.
As palavras solitárias não exprimem sentimentos. Mas são tão-só verdades parciais. São finitas, são poucas e insuficientes pois uma palavra faz-nos recordar aquilo que dela conhecemos com os sentidos, mas uma imagem, um perfume, um sabor, uma música, ou um toque, não só compreendem inúmeras palavras como nenhuma delas se demonstra suficientemente capaz de descrever nenhum deles.
E, por isso, por muito que escreva e me descreva e divague e me seja em tantas palavras nenhuma delas me consegue definir totalmente pois elas não são o completo, mas antes o incompleto, o parcial, o imperfeito.
Então a perfeição não está escrita e dela não temos definição senão como sendo o antagónico daquilo que consideramos como mau sendo, assim, um pensamento subjectivo e, por isso, indutivo.
E se digo que me sou naquilo que escrevo, percebo agora o porquê do meu afastamento perante uma multidão escura. Se as palavras são insuficientes para definir algo, então considero que se me escrevo com o mesmo intuito, não me consigo igualmente definir nem, sequer, me aproximar da minha essência. Sei tão-só que não sou um todo, mas algo parcial, sou imperfeita. Isto é o que de mim conheço. E se assim o é preciso de me conhecer primeiro para poder saber dar, depois, de mim aos outros.

És

Vou definir-te. Sinto uma necessidade exacerbada de o fazer. Quero chamar-te pelo nome que te engloba como um todo, que te bebe e possui, que te envolve e me embriaga.
Tens um olhar que é meigo e que me diz que é seguro. Mas não é meigo, é calmo. Não é calmo é intrigante e faz-me querer sabê-lo. Não se sabe é incognoscível. Mas assim também o não diria… queria apenas uma palavra para definir o teu olhar.
Tens um cheiro teu. Não é de rosas, nem de qualquer tipo de flores. É suave, é doce, assemelha-se à pele de um bebé. Mas é totalmente diferente. É, ao mesmo tempo, leve e pesado. É forte, é teu, completamente teu, tão singular… quem me dera conseguir defini-lo numa só palavra.
Tens uma voz inconfundível. Ecoa nas minhas paredes sapiente, parece saber o lugar meu. É grossa e rouca. É forte e altiva, alumia-me, mas não é rude. É reconfortante. É apaziguadora. E quando me soa baixinho, como que em sussurro ou num murmúrio, morro num só momento. Perco-me completamente e faço-me ser da voz que oiço para que a guarde sempre em mim. É incrível como um único som pode ser tanta coisa e coisa nenhuma, pois ainda não encontrei uma palavra que a voz te defina.
O teu toque. Parece magia. Enfeitiça-me. Sinto-me em lugar nenhum que não sei determinar. Perco quaisquer noções de tempo e de espaço. Tens um toque aliciante. É carinhoso e rude, áspero e terno e esta dualidade faz-me ansiá-lo sempre. Queria defini-lo numa só palavra.
Sabes… Sabes a… não é nem morango, nem menta, é doce… mas não o é. Parece que contém acidez, mas não sabe a nada disso. Sabes a uma mistura de coisas agradáveis, rosa, jasmim, morango, uva, chocolate... chocolate! Com uma combinação de sabores ambíguos, como  a laranja, o limão, a malagueta, a pimenta, a hortelã… Alias o suave, o puro a um género de acidez, que nada tem a ver com o que é ácido, mas que o é ao mesmo tempo… Impossível! É impossível definir o teu sabor numa só palavra.
Palavras.
Palavras e palavras contraditórias e complementares.
Palavras e palavras que nada dizem. São todas elas burlescas. Nenhuma delas te define e no entanto tentei escrever-te em tantas.
Pelos vistos, não és literatura. As palavras não são, de todo, ricas afinal. Se nenhuma te consegue definir significa que o vocabulário não é suficientemente extenso. Muito pelo contrário, é risivelmente pequeno, é pobre.
Ou então és tu que és demasiado… Não sei.
Sei que sou fruto da essência toda que és e que não sei definir. Sei que me enfrasco do teu perfume e outro não desejo. Quero beber do teu sabor. Quero ouvir-te mais uma vez com aquela voz que me faz ir e voltar de um lugar que não sei. É teu, pois só tu me mandas para lá. Quero sentir-me observada por ti, que o teu olhar me percorra e nenhum outro. Quero sentir-te. Abraça-me.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Não

Não é cansada, é esgotada mesmo. 

Quero não me ser.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Nua

Enxuga-me as lágrimas. Não quero mais chorar. Não quero mais chorar por ti.
Amanhã o Sol nasce de novo e eu só quero dormir para não acordar.
Pensei que quando me vendesses as tuas palavras afáveis eu me entregava a ti e serias comigo. Mas sou apenas eu. Esquecida. Largada no meio do nada.
Nua… Levaste-me tudo.

Nock Nock

Oiço um nock nock na porta. O meu corpo paralisa como uma estátua.
Sinto um tremer, um calafrio preenche-me o corpo todo e sou pedra naquele momento.
Pensamentos vários, múltiplos em voos de vaivém atingem-me e sou alvo de deliberações que não quero, imagens que não quero ver, recordações das quais não quero lembrar. Tudo dói e me parte.
O meu corpo não é mais do que um frágil pedaço de vidro facilmente estilhaçado. Estou petrificada e, de fora, se me não denotam um único movimento.
Dizem que morri. Não correm para me socorrer porque sabem que há muito que estou morta…
O espírito!
Vê-se a léguas. Ela está desalmada. Não sente. É pedra!
O corpo serve-lhe apenas como um instrumento de construção, de onde fluem ideias onde a maioria delas podem ser realizadas...

Sonhos

São sonhos. São meros míseros sonhos. Aparentemente insignificantes, mas que se repetem e me deixam em nenhuma outra posição senão como se vivesse essa prospectiva. Como sendo real, difamadora, dolente e terrível… terrivelmente próxima.
Quanto mais se aproxima mais monstruosa se me mostra e mais eu me sinto perdida. E pior do que me perder de ti é perder-me de mim. Se estou contigo eu sou contigo, mas se não estou, também não sou simplesmente.
É estranho procurar certezas em sonhos que  mas não podem trazer. Todavia aquilo que sonho é tão possível que me faz duvidar de que não possa acontecer.
E se acontecer, que fazer?
Não sei.
Morro só de sonhar. Não quero, por nada, que o sonho perca as suas capacidades oníricas e me esmague, que me aprisione com o seu olhar vencedor uma ínfima formiga derrotada no meio deste mundo todo.
Não me considero capaz de enfrentar tal coisa e já estou tão balançada que é o vento que me orienta o rumo.
Não sei são, probabilisticamente, as palavras que mais vezes profiro. Vagamente. São tão soltas e sem qualquer conteúdo… são o ar que respiro, no qual me envolvo e me embriago.
Desisti de te perceber. Sou limitada e as minhas capacidades inatas mo não permitem.
Pena sentir. Mas nada mais ao meu alcance está que possa fazer. Não é mais meu dever ocupar-me de um só remo se o barco só avançará com os dois.
Se o que sonho noite após noite sair do seu mundo imaginário para o mundo cruel e real não creio que as minhas forças queiram mais lutar.
Cansei-me. Esgotaste-me.
Não importa se gostas, se não cuidas, se não queres proteger e viver cada minuto como se fosse o último.
Nada do que digas que sentes é relevante se não me deres aquele abraço, se não disseres que queres que seja tua, se não me adocicares com as tuas palavras que sempre tomei como cheias para me preencherem.
Evitas-me e canso-te. E por isso, sou eu agora que me anuncio como fatigada. Sou apenas um ínfima parte deste mundo e há tanta gente melhor.
Quero que sejas feliz e quero sê-lo também.
Se me não queres não desperdices o pouco valor que tenho.
Se o não queres deixa-me ao menos guardá-lo.
Eu amo-te.
Mas pelos vistos amar-te não chega.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Bate Tolo, Bate

Bate. Bate. Bate.
É tão veloz quando te sente.
Não se esquece.
“É teu amor
É tão real.”

Bate. Bate.
É por amor.
Infame e louco,
Docemente apaixonado.

Bate. Bate e deixa bater.
Bate por devaneios.
Bate por anseios
meus.
Bate por te ver.

Bate e vai cedendo.
Escravo, fiel, obediente.
Como que incansável e resistente.
E, até, dolente.

Bate. Bate. Bate.
Admirável é sua firmeza.
Denota-se ávido e ímpar.
Tolo. Nada sabe sobre o amor.

Bate tonto. Bate em vão.
Não percebe.
Mas bate. E como bate!
Animal feroz.
Ameaça – que é já de sua raça–,
Deitar garras em terreno inimigo.
Bate tão cegamente que mesmo vendo não vê.
Não vê ou finge.
Porque o não quer.

E bate. Bate e
Ouve a voz da consciência.
Finge ouvidos moucos.
Grita porque ama e quer bater.
Triste.
Porque sabe que por amar
Se vai perder.