quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Fantasia

As flores dançam leves e harmoniosas consoante lhes indica o vento movimentos vários. Estão soltas e radiantes, libertam um cheiro inigualável, ímpar, seu.
As nuvens que rasgam o céu colocam a pureza do branco a um canto. Por elas rasgam-se, por sua vez, grandiosos raios que me incomodam os olhos, mantendo-os por isso, semicerrados.
Rodo a cabeça para ter uma maior amplitude deste cume.
É oficial. Ergo-me sobre o pico mais alto da montanha e apercebo-me, de facto, que me encontro no topo. Tenho uma visão enorme e quero unicamente absorver a plenitude desta sensação.
Não importa o caos em que vivo, quero esquecê-lo por momentos e dedicar este pedaço ao amor. Uma palavra cheia e imensamente vasta.
Sinto o corpo caloroso do sol que se mostra, observo ao longe a sonoridade da água da fonte que cai sapiente, cuidadosa, harmoniosa, toda ela cheia de magia, apazigua-me o coração.
Eu amo esta paisagem. E tão-só por amar é que a amo. Sejamos mais claros é, exclusivamente,  por amar que tenho acesso a esta imagem que amo porque o amor é contagiante e faz-nos reproduzi-lo nas ínfimas coisas, faz-nos sonhar com o impensável e amar descontroladamente.
E por muito aprazível que seja um prédio cinzento ser quase como um castelo quinhentista enfeitiçado, essa imagem não é mais do que algo controlado pela felicidade manipulada pelo amor. É falacioso. Mostra-nos o que não existe nem que – nunca – terá lugar.
É doce a relva que piso. Deito-me nela e logo esta se torna áspera, austera e agressiva, diria até que, repulsiva. Afasto-me da fantasia e percepciono o real.
O sonho é quase perfeito se conseguido com trabalho para que não se torne apenas uma sedutora ilusão. Tem um bálsamo tão irresistível que cedo compulsivamente e me deixo levar nesta beleza imensa.
Corro, penso, tropeço, canto, caminho, danço, rio, pinto, voo, mergulho, nado, brinco, deliro, falo, grito, sorrio, abraço, beijo, acaricio, vivo e não passa tudo de uma fantasia onde quero fingir ser, sabendo, perfeitamente, todos os danos colaterais.
No mundo da magia e da ficção vive o amor.
Mas o amor não vive, unicamente, nesse local metafísico, também vive aqui no cinzento real, onde do seu paradeiro não sei dizer.
Talvez por isso o fácil seja o mais acessível. Talvez por isso ame o real, mas mais o mundo do fantástico, uma vez que existe a reciprocidade colorida que não encontro no mundo saturado.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Vou dar-te uma novidade gigantesca e exacerbada: o mundo não gira à tua volta. Chocante e, a priori, a vontade é de tornar tudo isso refutável. É-o de facto, porque me refugio debaixo de uma grande abóbada hiperbólica. Contudo, há certas coisas que precisam de se tornar audíveis, que as deixemos tirar os nós nas delicadas gargantas.
Se a vida para ti é pautada por uma leve harmonia e uma densa segurança, a minha não o é por infelicidade minha. Se eu não sou borboleta aprazível o suficiente para puder voar no teu jardim que exala o cheiro teu, então expulsa-me logo do território onde não sou bem recebida.
Dizes que não com uma consonância pouco credível. Cubro-me toda dela pois quero fazer da mesma realidade do agora, apesar de saber o quanto distante me é.
Sei, perfeitamente, que a minha decisão vai afectar e por isso, vou esperar para ver se tens o despautério de me tratar com uma indiferença acrescida e desculpares-te com os meus próprios passos.
Meu caro, ponho-te à prova, sem o notares. Quero ver se és capaz de me querer com vontade intrínseca. Não chega um elogiar sobre as minhas delicadas patas, quero um elogio das minhas grandiosas asas, ilustres, esbeltas, que abarcam tudo o que sou e toda a beleza interior que detenho e que a confesso e a oferendo a ti.
Ainda voo aqui. Olha para mim. Estou aqui.
Não vou estar sempre. Também já me disseste que não fazes tenções que esteja. Não sou pessoa de crer no sempre, mas tenho tanta vontade. Alias-me à loucura e eu tento a todo o custo permanecer sã.
Não vou mais lutar por permanecer no teu jardim. Dá-me só um indício que eu voarei logo daqui para fora.
Se não consigo chegar ao teu coração então as minhas tentativas falharam todas e eu sinto-me gasta e incapacitada. Lamento porque te adoro.
Mas assim será. Permanecerá a sensaboria da nostalgia, da forte Saudade.


Passo em Frente

A racionalidade torna-se sumptuosa e irreversível. Também assim se tornam as minhas escolhas libertinas e, consequentemente, a minha grande decisão.
Um passo que, vendo a escassez de meios em que me encontro, me vejo obrigada a  tomar. Não é, de todo, tomada de ânimo leve, nem se me desenha graciosamente um leve e puritano sorriso num rosto ainda jovem e que já denota Cansaço.
É preciso batalhar por mim e por quem precisa de nós. É tempo de agir e, infelizmente, de magoar e de dar mais uma grande volta a esta vida que não se torna estável desde que começou o jogo das reviravoltas.
Estou cansada de não ser ouvida, nem querida. Por isso, esta decisão não irá afectar os demais que surdos são, pois sendo-o, não há mais surdez para além da mesma. Não há mais cegueira para além da mesma. E não haverá mais fala para além do que é tão tocado na mesma tecla pois serei eu mesma que lhes taparei a boca.
Espero saber o que estou a fazer. Na realidade estou bem receosa das consequências negativas que poderá ter este meu acto, mas se o não fizer, arrecadarei eu com elas e quem tenho que proteger. Contanto que, taparei os olhos com as duas mãos e, darei o passo em frente, esperando ardentemente que o chão que pisarei se não abra diante dos pés meus, para me não deixarem cair no abismo sem salvação.
Deixo tudo de lado e pensarei no pouco que é o mais importante, a minha integridade psicológica e a dela. Depois de tudo, somos mais unidas, ainda que contrárias, ainda que chocantes e conflituosas, temo-nos e tivemo-nos sempre durante este longo e incerto período, de choros incessantes e risos pouco constantes, abraços fortes e segredos que segredos para sempre serão, crescemos e endurecemo-nos porque, felizmente, apesar de toda esta reviravolta temo-nos uma à outra.
Não será agora que vou repensar isso por choros insinceros ou por ocasiões menos festivas. Como disse, se de mim não querem saber, então não saberão. O meu mundo vai mudar, assim como os meus objectivos. Neste novo rumo, procuro educação, bem-estar, atenção, o saber ouvir, apoiar, consolar, procuro amor.
Amor há muito desvanecido, escondido, quero exaltá-lo, brotá-lo para que nunca mais se o tranque no velho baú, junto à saudade.
Nem sempre as coisas são tão negras e eu pintei-as dessa forma por estar cega de amor. Amor traiçoeiro e doloroso, amor que sei que a outra parte, devido a este terrível factor, abdiquei e que pretendo agora redimir-me para a compensar.
Sou, portanto, pecadora, e no entanto só procuro a luz, a paz. Quero dar descanso a este pobre coração que se dá a conhecer para depois ser mal aproveitado.
Cansei-me de ouvir e calar sobre o que é erróneo. Se nada mais relevante se interpuser a esta condição, darei um passo em frente para mudar o meu/nosso futuro.


Cheia de Silêncio

É madrugada. As horas teimam em não passar. Quando mais pensar não quero, não consigo não mais o fazer.
 Estou cheia de Silêncio.
Não tenho palavras, nem sons, nem gestos, nem expressões. Estou presa, algemada pelo Silêncio.
Quero vestir uma roupa limpa que não conheço.
Ainda é madrugada e não há João Pestana que me faça adormecer.
Oiço-o, pé ante pé. O som torna-se cada vez mais intenso, cada vez mais audível. Fecho os olhos, procuro não pensar. Qualquer coisa… Qualquer coisa! Nada me vem à cabeça. Porque é que não me vem nada?! O coração bate louco e veloz, sinto vontade de segurar o peito para que este de lá não salte. Grito no silêncio, corro no silêncio, mas as portas fecham-se todas perante mim, abafando indignamente qualquer tentativa de som!
Entra. Tem um caminhar determinado, omnipotente, egocêntrico, de quem sabe o que me espera. Cobre-se-lhe o rosto um sorriso malévolo. Balbuceia coisas várias que faço já por não ouvir.
Fecho os olhos, não quero ver. Quero fingir que não estou, que não sou.
Sinto a pouca roupa, que me adoça o corpo marcado, a afastar-se  violentamente do (m)seu leito.
Não é delicadeza, mas antes uma densa forma de brutidade e agonia simultâneos.
Não sei já o que me dói. Se o hirto cinto de ontem, se estes movimentos incessantes e contínuos do coito… Dói-me o medo. A prisão das palavras que sufocam por não saírem.
Tem uma força sobrenatural e rude, áspera. Não se cansa nem pára.
Aproveita-se da minha leveza e imaturidade e vira-me de modo animalesco, selvagem. Permaneço de costas. Muda a sua meta e escorrem-se-me agora lágrimas.
Não emito qualquer som. Fito o relógio. Os tic tac’s são demorados e asfixiam-me, morro demoradamente em cada um. O tempo não passa.
Ele satisfaz-se e eu acobardo-me.
Como queria que chegasse Segunda-feira…

P.S.: Este texto foi uma tentativa de me pôr no lugar de uma criança que sofre de abusos pelo pai, pois precisava de pensar um pouco no sufoco que estas crianças vivem para conseguir chegar a elas, uma vez que estou a fazer um trabalho sobre a APAV (Associação Portuguesa de Apoio à Vítima). A imagem é de uma das campanhas feitas pela mesma, pus uma das que considero mais bem conseguidas.

To Hate

Espetam-se as músicas enquanto cambaleio pois não sei mais cuidar de mim. Sou tão inútil que nem força tenho para lutar contra os sentimentos.
Deixo-me cair e ser pisada segurando-me fortemente ao pilar da minha única sobrevivência, aquele único de maneira tão intrínseca me liga a ti.
Não quero mergulhar sem saber se é seguro e, sem de mim saber, já me encontro submersa e os meus músculos parecem tensos e têm receio de me fazer nadar.
O mar é um mundo. E tal como a palavra indica, é vasto, bonito e igualmente perigoso. A sua penetração não é, de todo, uma fonte segura e já lá ficaram tantas cabeças.
Por favor que não lá fique a minha.
Parece que tudo é desfocado e o dia está tão claro e a água tão transparente.
Estou tão cega de sentimento que só te vejo a ti.
Estou doente. Extremamente doente. Para aonde foram os médicos agora que me sinto tão fraca? Que medicação terei de tomar para aliviar este vazio, este sofrimento permanente, esta angústia, esta “felicidade” de vaivém?
Estou de cama, maluca, a alucinar, a amar quem se não deve, a ser-me demasiado, a dar de mim quando não devo, que raio de instrução recebi eu? “Se te magoam continua lá”?!
Não quero viver nenhuma mentira ou viver um amor intenso sozinha.
Que alguém me puxe deste barco porque eu não quero afundar-me nele sozinha.
Já mergulhei neste mar profundo e de lá quero distância senão não conseguirei aqui continuar viva.
Obrigada por me fazeres gostar de ti para agora sofrer por gostar-te demais sem reciprocidade.


Ponte

A vida é efémera, finita, padecente. Sobre ela erguem-se pontes várias. Ergo a minha com as dificuldades fisionómicas que detenho.
De nada valem as preocupações, as tristezas, os sorrisos taciturnos e plácidos pois não são eles construtores da minha ponte alta, apenas  fazem dela mais pesada, menos alegre, cada vez mais da distante da fronteira já pouco visível.
É preciso ter consciência e ser acima de tudo isso.
Ainda não sei o que procuro, mas sei o que me falta. Sou incapacitada de consegui-lo e tenho uma vontade fraca de desistência.
As palavras caem e perdem o seu sentido. Se são usadas e abusadas desprovidas de inteligibilidade, se caem por cair e não olham para trás nem para o seu rumo, se caem em qualquer lado e de qualquer forma, então não são mais palavras.
Qualquer outro epíteto se lhe pode conceder menos esse. Porque eu amo as palavras. Mais do que amar a palavra palavra em si, amo todo o seu conteúdo que para mim não é vazio, é consciente, é cheio, é um Todo, cai com sentido de quem sabe e se orgulha daquilo que é, e que eu procuro o seu uso sem abuso para me perfazer.
Sustento-me de vocábulos, mas sinto-me cansada, exausta desse vazio que por todo o lado vejo.
Talvez seja um pensamento pessoal e intransmissível que seria tão mais se o não fosse. E a partilha com um outro sujeito poderia ser florida e colorida, e por ela se desenhar um arco-íris. Com a inocência com que uma criança pega nos seus lápis com cores diferenciadas e aproximadas daquilo que pretendem ilustrar e deixa o seu traço conciso fluir. Porque ela sabe o que desenhou e defende muito melhor que eu que não vejo o vasto muito que ela vê porque já tenho palas.
É uma inocência puritana. Até mesmo as suas palavras pressupõe um intenso significado e são tão belas com aquela pronunciação ainda insípida, mas segura, sempre segura.
A minha ponte é cheia de palavras completas e ainda não são suficientes, é infinitamente grande e vasta, mas as palavras não chegam.
Por isso, complemento-as com o conteúdo com que as preencho e talvez assim alcance a outra margem.
A intelectualização das emoções, faz de mim um ser muito mais racional e objectivo, pragmático e utilitarista ou antes Kantista nalguns dos seus princípios.
O difícil está precisamente na evasão para esse exterior intelectualizado, onde olho de fora de mim para dentro, como um estranho que me observa e me interpreta com os meios poucos e incongruentes de que dispõe.
Esta acção conduz-me a repensar-me como uma demente ininteligível incapaz de se deixar penetrar no seu mundo ou no dos outros, para poder coexistir.
Fundamentos baseados na impropriedade dos dados, donde extraem, consequentemente, a falaciloquência.
Não baixo, portanto, a minha muralha, para que as suas armas rudimentares me não possam atingir.
Não percebo percebo atitudes dessa natureza e não percebo porque continuo a ser cada vez mais díspar, cada vez mais distante.

P.S.: Mar, o homem e o turbante são stock, tudo o resto foi da minha autoria.