segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Conchinha

Vou escrever. Se tenho uma diferente temática? Sim, tenho. Novos temas sobre os quais me debruço, mas não hoje. Hoje fui toda eu pintada de um denso cinzento, indiferente. Cinzento como o tempo que hoje se pôs, como o vento atroz que soprou, como a chuva impiedosa que do seu céu se desfez e caiu sem pensar.
Hoje também eu não queria pensar e ser de um cinza sem sentir coisa alguma. E ser o que não é. Estar presente não estando, gritar sem qualquer som emitir, fechar a minha conchinha e só dentro dela e a ela me confessar.
Já não lhe dou as minhas palavras pois o preço das mesmas acresci tendo em conta o vocabulário burlesco – e desprovido daquilo que o faz não ser oco –, que por todo o lado vagueia. Não, as minhas palavras são diferentes. São robustas e bonitas, cheias e fortes, significam.
As minhas palavras significam. Mas ao serem palavras, é-lhes atribuída a mesma conotação que as outras e, como vence o maior número de cabeças, as minhas morrem afogadas sem ninguém dar conta, sem nada nem ninguém que as salve.
Não posso comunicar por palavras, mas outro método não desejo para me exprimir. Hoje encho-me de palavras minhas que são tanto, mas que no meio da multidão um Nada são. Escrevo e parece que nada digo.
Ainda bem que só me confesso a mim mesma. Hoje, conchinha cinzenta, só tu me ouves e compreendes, só tu me proteges, só tu sabes o quanto te engordam as minhas palavras.
Hoje, conchinha, apesar de estar toda eu pintada a cinzento, sabes bem a quantidade de infinitas cores que detenho. Só tu sabes, conchinha. Só tu.

Duas Realidades

É outro mundo, são dois momentos distintos que se anulam.
São outros pensamentos, são outras palavras, outros alinhamentos, diferentes (des)equilíbrios.
É uma outra atitude, numa outra rebelde e jovial maneira de estar.
São olhares penetrantes que mesmo observando a mesma coisa o mesmo não vêem. São outros tons vocais, são onomatopeias não estereotipadas.
São interesses que não se completam que, quanto muito, se opõem.
São diferentes. São duas realidades antagónicas.
É o concreto contra o abstracto.
O azeite com a água. Não se misturam.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Música vs Silêncio

Amo a música. Faço dela a minha voz interna, faço dela o meu ser. Preencho-me nesse todo e sinto-me como que evadida para uma outra dimensão incognoscível por todos, menos por mim. É o meu espaço, o meu mundo ao qual recorro numa loucura desvairada de me querer ser para mim e revelar-me só a mim, como se ali ninguém pudesse saber o meu nome nem me ver, onde a verdade seria uma constante e todas as coisas significariam. Nada é em vão e as palavras são tidas quase como uma decoração interior, a falta desses objectos ou o exagero, o Kitsch, faz diferença. É nessa realidade que eu me iludo. E talvez possa não ser o mais correcto, mas é o que me faz perdurar ainda a vontade de acordar num amanhã que terá de vir, pois o tempo é incontrolável.
A música tem este poder todo em mim. Talvez por essa mesma razão as pessoas me vejam feita louca quando me observam com aqueles olhares críticos e pejorativos, negros e dolorosos, falando sem palavras daquilo que não percebem. Falta sentimento a estas máquinas que se movem e coexistem segundo uma força qualquer superior que não entendo nem quero, tenho receio de ser também um deles.
A música traduz todas as minhas emoções, boas ou más. E eu sou com ela, sinto-me com ela, sou importante com ela, por ela e para ela. Ela é quase como o meu sentido orientador.
“Nós amamos a música porque se opõe ao silêncio.” É uma afirmação completamente válida e verdadeira. Todavia, não me é possível não me ser em cada melodia - a própria palavra já sugere um mundo externo aprazível - e não é que eu não goste do silêncio, às paredes confesso que amo a música porque tenho um medo astronómico do silêncio, daquilo que o mesmo me proporciona muitas vezes. Se a música para mim se resume a uma evasão minha para uma utopia que eu mesma criei, o silêncio destrói tudo isso e deixa-me como que num quarto escuro, sozinha com os meus pensamentos. E o pensar destrói-me, corrói-me, mostra-me a Fealdade, a realidade nua e crua e eu choro, mas as lágrimas não limpam atitudes nem saram feridas, não ajuízam as pessoas nem conseguem ser capazes de mudar nada. Acontece exactamente como acontece. A minha memória retém tudo isso e é no silêncio que tenho vergonha de ser uma pessoa, é no silêncio que me quero despir de mim, de tudo.
É no silêncio que eu abraço a realidade e morro no meu próprio leito.
É no silêncio que eu tenho medo e, por isso, embora me regozije nestes momentos de lucidez, temo-os. Parece mortífero, maligno, repudiável. É uma caverna sem luz.
É no silêncio.


P.S.: Sinto a minha escrita cansativa e repetida, quero escrever sobre tantas coisas e não sei como, parece que me faltam as palavras. Embora este texto ainda não esteja como eu o gostaria de escrever defendo, a meu ver, uma ideia muito forte que precisa de ser expressa.

Sopro do Vento

Tenho os pés gelados, já se sente o avizinhar de mais um Inverno. O vento sopra lá fora, gritando e afugentando enraivecido os males do mundo – as pessoas. Se pudesse, soprava com ele.
Sopra também à minha janela procurando afastar-me mais para onde eu não sei, para onde não caibo nem lugar tenho.
Se lhe contasse um segredo sei bem que ele não o manteria sobre esse mesmo estatuto, mas eu sentir-me-ia tão mais aliviada se ele me ouvisse. A verdade é que nem sei o que lhe dizer nem contar. Queria contar tanto de mim e não consigo. Fui-me perdendo por entre densas entregas e, de mim, já pouco detenho.
Estou que nem um puzzle de mil peças com apenas duas montadas. Todas as minhas peças parecem incompatíveis umas com as outras, díspares e confusas sem nada que as ligue entre si nem elas a mim.
Pergunto ao vento por mim numa atitude já saturada de me ser, mas ele apenas sopra. Sopra louco, desvairado, forte e imponente. Sopra porque sou também pedaço de carne maligna e pecadora. Sou também pessoa. Pessoa que ele quer afastar, mas desta vez, para eu não mais a mim mesma afectar.

sábado, 23 de outubro de 2010

Perdida de Mim

As paredes parecem começar a degradar-se, as portas parece que derretem, o chão ganha uma textura algo estranha que me desconforta e eu, que faço também parte deste ambiente, cai com todo ele. É o meu degredo.
Grito em silêncio por entre estas paredes já moucas e procuro consertá-las a todo o custo. Vejo esta construção tão imponente em tempos apresentar-se agora tão caótica. É uma memória e ela quer ser um Nada. Eu colo cacos, seguro com pés e mãos tudo para que tudo assim se mantenha, mas nada parece resultar.
Tudo vai caindo, desfalecendo a pouco e pouco… e eu com eles. Estou quase à altura do chão. Toda a sumptuosidade é agora irrelevante, inacessível, deixou de o ser. É apenas triste.
Estou caída e não tenciono levantar-me. Parece que quero afogar-me na minha memória e perder-me no meio das sensações, esquecida do mundo, perdida de mim.


repito para mim baixinho infantil e estupidamente: volta.

sábado, 16 de outubro de 2010

Desfecho de Mais Um Capítulo

Sinto-me esquizofrénica.
Desde que o meu lado irracional naufragou em alto mar, o meu lado racional declarou-lhe guerra. Uma guerra impiedosa e sangrenta que faz de mim um ser de personalidade dupla.
Há tanto que o esperava, há tanto que pensava que seria o melhor e, agora que o vento sopra fraco e que as terras desconhecidas me chamam e parecem tão tentadoras, quero continuar na minha canoa a remar com um só remo feita louca, presa na minha própria memória, na minha própria ilusão.
Se por um lado quero incessantemente discernir o certo do errado, por outro de nada quero saber, quero apenas voltar atrás e prolongar o último beijo.
Sim, o último beijo. Porque foi tão incipiente e eu não sabia que era o último. Foi tão incompleto e inacabado...
O último abraço, que já tanto tempo faz.
O último sorriso que lhe mostrei… que nem me lembro…
A minha canoa naufragou há já muito tempo e eu não dei conta ou não quis. Ainda não me conformei, mas tenho que aceitar a realidade e não posso viver um passado que nem existiu realmente da forma como eu penso que o recordo.
Vou só guardar o teu sabor.
Porque apesar de tudo... foste a pessoa que mais amei.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Ilumina-me

Está escuro. Tudo parece desacreditado, inacessível, insaciado.
Falta-me luz e o amanhã soa a pesadelo. Tenho medo das palavras. Porque são as palavras mais do que armas mortais, mais do que espadas grotescamente aguçadas. São tudo aquilo em que ingenuamente acredito e me perco e me sacio. São o meu degredo. O meu erro. A minha incompatibilidade com o acto fugaz e repreensível de sonhar.
Porque o sonho não passará – nunca – do inconcretizável, das utopias vendidas, do sem lugar.
Queria ser iluminada, preciso de me prender sem arrependimento nem retrocesso.
Escasseia-se-me já a vontade e a coragem, toma-lhes lugar a cobardia e o vazio. É com insignificância que me sinto e a com que me não sinto aquando estou rodeada por uma multidão que esvoaça luzes no ar para iluminar o palco apagado mas tão presenciado.
E eu, que me encontro no meio de tantos e apercebida por nenhum, vou repetindo para mim em silêncio, querendo crer no incrédulo: "Ilumina-me enquanto não há amanhã". 

P.S.: Escrevi após ter assistido a um concerto de Pedro Abrunhosa. Depois de ouvir pela primeira vez a música "Ilumina-me" não lhe pude, de forma alguma, ser indiferente. É muito bonita, embora o facto de não conseguir acreditar na mesma me entristeça.


quinta-feira, 12 de agosto de 2010

O Preço das Palavras

Quanto custam as palavras? Serão caras? Haverá palavras em segunda ou terceira mão dispostas a serem vendidas em leilão? E de que modo se comportam as tão bem conhecidas adopções de locuções sendo quanto maior a idade, maior o seu desuso e menor a sua aderência?
Claro está, que nesta tabela de preços existe uma fiel hierarquia que se pressupõe como regra, mas há já tantas que do cimo da pirâmide são vendidas e proferidas ao preço da água...
O que é feito da invenção das palavras? Daquilo que sentimos e inventamos por meio de neopalavras aquilo que ainda não teve lugar? Que só existe enquanto ideia ou sensação e criamos enquanto palavra? Pessoalmente, admito que tenho o vício, um tanto singular, de rotular todas as minhas pequenas grandes invenções e não as vendo - nunca -, só as ofereço a quem as faz por merecer. 
Todavia, com a crise e com o aumento do IVA, depreendo que o preço das palavras  tenha acrescido abusivamente contanto que se tornou difícil, para muitos, recorrer às mesmas.
Há palavras que são apenas demasiado dispendiosas para serem proferidas... ou isso ou eu não dei conta que retrocedemos a um regime ditatorial onde a liberdade de expressão é inexistente, onde as palavras mais sentidas equivalem a penas de morte imediatas.

Não encontro mais nenhuma razão para justificar o porquê de tu não mas dizeres.
 

quarta-feira, 30 de junho de 2010

O Vazio

Sou pesadelo. Sou noite fria de Inverno.
Durmo ao relento e deixo o frio picar-me a pele. Estou gelada e despegada do mundo. Cortei a corda que nos unia e unificava.
Sou o terror da noite. Sou a noite.
Sou o escuro, o que não tem nome. Sou incorpórea, viajo por entre toda a gente e de dentro de toda a gente lhes vejo o buraco. É um buraco a todos comum, unânime, incipiente, desajeitado, mas sobretudo é um buraco vazio, característico da natureza humana.
Cheira mal, sabe a qualquer coisa putrefacta que ninguém ousa tocar porque lhes parece que quanto menor for o seu afastamento mais danos lhes poderá causar.
A distância parece-me então também minha aliada. Observo de longe o vazio, o Nada que têm dentro. Os sorrisos que simulam as pequenas máquinas despidas, vazias.
Sinto-lhes o vácuo. Ecoam-lhes por dentro vozes soltas perdidas, que procuram na verdade um superfície sólida, preenchida, minimamente cheia. Mas não encontram porque tudo isso nada mais é do que uma utopia. Como muitos "eus" que se nos contam nos quais acreditamos enquanto seres ingénuos.
O cheio não tem lugar. Tem o vazio.
E do vácuo que persiste na nossa essência ninguém lhe consegue escapar. Faz parte da nossa própria natureza a nossa mesma decadência.

terça-feira, 22 de junho de 2010

W a k e m e u p w h e n i t ' s o v e r

domingo, 20 de junho de 2010

Marioneta

Estou presa por fios. Sinto tal e qual uma marioneta, cujos movimentos são feitos à vontade de outrem, seguindo  ordens que não as minhas, comandando um corpo alheio que é meu.
Apetece-me cortar os fios que me aprisionam para fatalmente cair sem nunca mais me erguer.
Mas não lhes chego, ou não lhes consigo realmente chegar porque a minha insignificância alia-se à cobardia e escondo-me por detrás da minha pequenez para desculpar a falta de aparência quando são horas de agir.
Tudo se afastou ou tudo afastei. Os meus passos são o único som audível. Ecoam desnorteados por entre frequências desacertadas e loucas.
Olho para trás. Quero ver pelo menos uma sombra, ouvir uma voz, ver uma mão para me agarrar e dizer que precisa de mim. Mas não há. E, por isso, afundo-me dentro do meu casulo e penso que mais escuro do que é estar cá dentro é estar lá fora. Pois todos os corpos são mutantes que me vêem como não sendo da sua mesma espécie. É como se houvesse algum problema com o meu cheiro natural por não ser equiparável ao de toda a gente.
Também eu me sinto estrangeira no mundo deles. Não temos as mesmas cores, não soamos da mesma forma e os meus passos embora descompassados quase que gritam por uma companhia num bailado popular.
Não encontro correspondência. E o fundo é infinito. A tona é fatal. Os monstros indiferentes.
Por isso,  sou uma marioneta. Respondo sem vontade própria e desfaço-me por entre a multidão.
 
Caio e ninguém vê.
 
Grito e ninguém ouve.
 
Morro e ninguém sabe.

domingo, 13 de junho de 2010

Desnuda

N ã o c o n s i g o . Q u e r o d e s p i r - m e d e m i m . . .

Qualquer Coisa

Mata-me a mediocridade dos meus temas. A sua redundância. Não só o que sinto, mas também a repetição e o aborrecimento com que se apresentam.
Os meus olhos incham e o mundo parece não querer mais colorir-se. Tenho noção que não mais me serve. Estou mais magra, portanto posso atribuir a culpa ao mundo que não mais me serve. Está–me largo, imensos números acima, eu tento e não consigo servir-lhe. Pareço fazer-me de tola em não querer entender que não dá.
O “chega” parece-me sempre prematuro e inconclusivo, irresolúvel, mas mostra-se sempre o único realmente eficaz.
NUNCA – dou-lhe um ênfase enorme porque realmente é um nunca – acreditei quando se me diziam que deixavam de ter fome, ou que o sono lhes faltava ... sempre encarei tais coisas como meros caprichos, o amor a falar em exagero, a exercer a sua sumptuosa hipérbole por entre estes tantos humanos desajeitados. Essas coisas de doenças de ansiedade por amor sempre foram para mim uma grandessíssima mentira para uns engolirem e outros enriquecerem com as mastigações alheias.
Agora reconheço que é real. Tenho nojo de mim. Pelo que me transformei, pelo que sinto, pelas insónias, pelas  horas que não passam, pela má-disposição que me detém, pela comida sensabor… Não percebo este estranho mecanismo a que chamam “corpo”. Não basta todas as complicações que já tem por si só ainda se lhe acrescentam aquelas que provêm do estúpido acto de amar.
Chamem um médico quero matar as emoções. Quero mesmo!
Não percebo qual é o seu objectivo se tudo em meu redor se apresenta “pointingless”. O mundo não é mais como o desenhei e pintei por muito que assim o queira ver. É desnaturado, entediante, falso, cinzento e, sobretudo, não soa a nada senão a repugnantes mentiras. Estou cansada de tentar entrar nas calças do mundo. Contudo, agora percebo que sou eu quem não quer que elas me sirvam.
Quero continuar fiel a mim mesma embora caminhe em círculos sem fim, sem objectivo. Tenho medo de todas as máscaras. Percebo que não me é possível viver sem uma.
Então não sei como viver. 

Tudo é “uma coisa qualquer”.


P.S.: Imagem retirada do google ao acaso, é uma coisa qualquer, não importa, nada importa.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Não Quero Mais Saber

São mais palavras.
Palavras que proferes sem saber o que dizes. Falas para eu sentir quando só o sentes pela metade e fazes-me tantas vezes – embora já eu as conheça – sentir-me como se fosse realmente eternamente desejada.
Gostava que a ingenuidade não mais me iludisse porque todos os dias em que acordo são amargos porque recordo o meu inferno.
Quero fechar os olhos e fingir que me esqueci de ti, embora parte de mim te agarre, espartilhando-te para nunca esquecer.
Se for não for real o que dizes, até porque o não demonstras, deixa-me adormecer a parte intrínseca que construíste em mim.

Sussurro

Sussurro. Um murmúrio. Baixinho tão baixinho que muito mal se ouve. Diz-me aquilo que sei, mas que finjo não ouvir. Magoa-me só de pensar. Não quero acreditar, não posso acreditar que seja real. Nego tão veemente que me iludo numa utopia vivo naquilo em que apenas superficialmente acredito.

sábado, 8 de maio de 2010

Chuva Que Me Silencia

Parece chuva. E não aquela que cai igual a todas as outras lágrimas que nem retiram nem acrescentam qualquer tipo de emoção. Todas as sensações são inerentes a esta chuva que cai forte, concisa, esmagadora.
O impacto de cada gota não é mais ocasional, mas existe antes a predominância intencional de uma isotopia que nada mais é do que aquilo que me rodeia.
Não tem quaisquer variáveis mas a sua forma reprodutiva mantém-se equiparada àquilo que sempre se propôs.
Observo quieta. Não tenho olhos do lince, embora tais olhos inveje. Mantenho-os antes semicerrados como se ansiasse como que uma penumbra, ver um mundo sobre um enevoado irreal e improvável, cego e incrédulo.
Sento-me numa atitude desesperada e desenfreada de me isolar, quero tão-só estar só e esquecer que vivo e que coexisto num mundo repleto de seres iguais a mim, logo eu que me pareço tão peculiar. Anseio demasiado a solidão e sinto que só nela me sinto, como se sem companhia, ela fosse a minha única companheira, como que ainda que só nunca o estivesse. Tenho também a chuva. Chove conforme choro. Parece que ensaiámos juntas como numa cena teatral que sugere a auto-reflexão numa tentativa esgotante de expressão. Estou descoberta e, por isso, mais do que sinto toda esta vivência ela toca-me gelada e fria, sensabor e dessaturada, surda, mas tão sensível. Queria dançar, mas falta-me a vontade agora. Neste momento tenho vontade de o preservar para todo o sempre, eternizá-lo para nunca o ter de relembrar pois seria sempre uma memória presente.
Estendo os membros no chão que me sustenta. Sinto como se me desmaterializassem, como se cada pedaço meu fosse facilmente desmontável e tivesse de ser retirado durante um curto espaço de tempo para poder descansar sem mais pesar. E a chuva lava-me o corpo nu como se o tornasse imaculado e o purificasse e livrasse de todos os males mundanos. É a chuva que me silencia com as suas palavras nunca expressas sobre qualquer forma encarável, reconheço-as eu porque as comando.
As suas gotas confundem-se com as minhas e é neste momento que eu percebo que nem eu choro nem a chuva resulta do mesmo princípio, mas tão-só somos o mesmo, choramos pela mesma razão, da mesma maneira, ao mesmo tempo, com a mesma intensidade, partilhamos a mesma agonia e ambas sabemos que não sabemos chorar.
Somos uma e esta ligação é mais rica, é essência, é uma questão incontrolável de sobrevivência.
Eu sou nada e ela nada é. Não tenho sabor nem cor, sou inodora e descompassada, triste e pedaço de algo que não é. Só creio na minha existência porque – ainda – penso.
Só me falta não sentir para não mais me importar de ser. Porquê eu, logo eu, que valorizo tanto as emoções? Podem perguntar-se-me. Mas de que me serve tanta ambiguidade emocional se com tanta homogeneidade de seres que coexistem comigo ninguém as partilha e preferem antes distorcê-las e feri-las, fazer delas pó que nunca foi?
Não quero, por isso, mais sentir– nunca.
Nunca.

Coração

Vejo-te com vida. Tanta vida. Sei-o bem, bates por dois. A tua energia é inesgotável e o cansaço é incomportável, não tem lugar simplesmente.
Os teus olhos brilham e não é só este sol radioso que tos alumia, mas antes uma estabilidade que nem todos estão aptos para a alcançar, mas tu sim, sem qualquer dúvida.
É mais do que uma certeza, é um dogma.
Sorris porque sabes o que tens. Eu vejo-te e amo-te de um estranha maneira e cega. Felicito-te porque percebo que te encaixou. Brilhas, tens uma vitalidade redobrada, comportas dois corações.
Dei-te tudo de mim, entreguei-te o meu coração, entreguei-me. Não vivo, nem ofusco, não reajo porque to dei para guardares, salvares, para amares e estimares porque é teu.
Sinto-me vazia e completa simultaneamente.
Todavia, agora que te sinto distante, aproveitando o que de mim te pertence para proveito próprio dilacera-me.
Queria-o de volta sem remorsos nem qualquer tipo de dor. Queria porque quando to dei pensei que o amasses, pensei que soubesses o valor daquilo que tens em mãos.
Mas desconheces. É-te estranho e apartado também.
Penso que nada mais de mim podes levar e pouco mais tenho para chorar.
Perdi-te há muito tempo, tu és o único que ainda o não sabe.

sábado, 20 de março de 2010

Quando danço porque sou?


Porque sou? Porque gosto? Porque sinto e me apaixono mais e mais por cada passo, por cada dança, por cada gesto, por cada som que flui, que me guia e guarda e me sente e é?
Que se racionalize a emoção de cada bailado porque cada passo é forte e hirto e é belo e adorado, é limpo, é intocável, é puro é…
Vou dançar. Mas porque danço?
Danço porque sinto, porque me sinto. Porque voo. Danço porque a dançar me sou. Danço porque me evaporo e de tudo me esqueço. Danço porque me entrego a cada dança. Danço porque me comovo, danço sobretudo porque sinto que se não dançar morro.
E de tudo me desfaço e neste mundo já não moro. É celeste mas não é céu, é imaterial e ninguém conhece. Partilho-o com tanta gente e com gente nenhuma.
Sei de cor cada sentimento. Ainda que a técnica me falte trago ao peito a alegria e a dor. Sei de cor este meu amor, deixem-me enamorar, deixem-me para sempre dançar.

P.S.: Fotografia de Nelson Martins.

sábado, 6 de março de 2010

Fui-me

Sou criança. Caminho agora tão perdida. Não há qualquer corda lançada para me salvar desta lava ardente, desta vida com perfume decadente.
Fecho-me dentro da minha caixa e da sua chave me desfiz. Continuo, contudo, desprotegida, sozinha e não sentida.
Nada faz sentido e desta vez não me quero sequer reencontrar.
Só quero fechar os olhos para nunca mais abrir. Quero-o tão intensamente e não consigo conceder-me esse desejo. Deixo cair cacos meus e não procuro juntá-los. De nada valem.
O sempre. Dói-me tanto. Quero arrancar o coração. Deixem-me arrancá-lo!
O mundo está todo corrompido e eu nele não consigo coexistir. Os meus valores diferem dos da multidão,  eu enrolo-me cada vez mais dentro do meu casulo e ainda assim conseguem atingir-me! Aquelas espadas são capazes de tudo e eu capaz de nada.
Devia desfazer-me do meu amor se o amor não me consegue amar. Ironia do vocábulo.
Triste pessoa. Ri-te. Rio-me.
Fui-me. Agora só quero morrer.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Perdida

São estradas, moradias, ruas encobertas.
Não se avista o sol ou qualquer ínfima luminosidade, a noite asfixia a vida.
São paredes incompletas, desfeitas, dilaceradas que fazem jorrar sangue de outrem. Tijolos amargurados finalizam objectivos de tempos outros e é a poeira quem lá habita.
Deixada a céu aberto para que este lhe conceda a sua sina, os fortes ventos plantas várias erguem como pássaros audazes em voos rasantes. Estas encontram o seu novo leito desenraizado da sua obra-prima original, nestas ruínas anónimas, sardónicas e temerárias. Pedaços de nada, anulados perante tudo aquilo que respira. Não assumem qualquer posição nem têm qualquer vontade.
São tudo de um Nada. Perdidos.
Por essa degradação os meus pés me indicaram o caminho como se o corpo e a mente estivessem por breves momentos desligados, dissociados e conversassem em línguas antagónicas e incognoscíveis. Dei por mim como sendo cada racha das paredes já desfiguradas, cada tijolo que da sua naturalidade se desencontrou, cada pó dantes soprado. Dei por mim enclausurada nesse retiro. Dei-me como uma ruína, anónima e perdida de tudo e de mim.

P.S.: Fotografia de Nelson Martins e edição da minha autoria.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

São Só Palavras

Não consigo escrever.
Estou tão cansada de tudo e tão fraca que não quero lutar por nada.
Penso que não existe amor ou qualquer coisa com tal ignóbil sentido. Parece que não lhe sabem dar o devido valor, ou poucos sabem. Gostava que alguém no mundo pudesse compreender o meu pensamento para me sentir menos estrangeira e viver mais humanamente. Todavia, tudo o que vejo de humano tem valores corrompidos e corrosivos. Deles quero distância.
Tenho vergonha daquilo que sou pois os meus princípios parecem e permanecem, para muitos, risíveis. Talvez seja ingénua por pensar que há então valores, que no mundo existe algo de bom e colorido que me faz querer ser mais e mais nele.
Mas esse sonhar que me envolve, que me cega e constrói nessa utopia, rasga-me por dentro. Deteriora-me. Esfola-se-me na pele. Deixa-me num estado deplorável capaz de nada.
Sou sensível e inutilmente cedo a qualquer afecto. Parece burlesco. Que ser idiota. Sou capaz de me entregar se me cantam numa canção simples que demonstra superficialmente a minha essência. Já devia saber o que são as palavras.
As palavras solitárias não exprimem sentimentos. Mas são tão-só verdades parciais. São finitas, são poucas e insuficientes pois uma palavra faz-nos recordar aquilo que dela conhecemos com os sentidos, mas uma imagem, um perfume, um sabor, uma música, ou um toque, não só compreendem inúmeras palavras como nenhuma delas se demonstra suficientemente capaz de descrever nenhum deles.
E, por isso, por muito que escreva e me descreva e divague e me seja em tantas palavras nenhuma delas me consegue definir totalmente pois elas não são o completo, mas antes o incompleto, o parcial, o imperfeito.
Então a perfeição não está escrita e dela não temos definição senão como sendo o antagónico daquilo que consideramos como mau sendo, assim, um pensamento subjectivo e, por isso, indutivo.
E se digo que me sou naquilo que escrevo, percebo agora o porquê do meu afastamento perante uma multidão escura. Se as palavras são insuficientes para definir algo, então considero que se me escrevo com o mesmo intuito, não me consigo igualmente definir nem, sequer, me aproximar da minha essência. Sei tão-só que não sou um todo, mas algo parcial, sou imperfeita. Isto é o que de mim conheço. E se assim o é preciso de me conhecer primeiro para poder saber dar, depois, de mim aos outros.

És

Vou definir-te. Sinto uma necessidade exacerbada de o fazer. Quero chamar-te pelo nome que te engloba como um todo, que te bebe e possui, que te envolve e me embriaga.
Tens um olhar que é meigo e que me diz que é seguro. Mas não é meigo, é calmo. Não é calmo é intrigante e faz-me querer sabê-lo. Não se sabe é incognoscível. Mas assim também o não diria… queria apenas uma palavra para definir o teu olhar.
Tens um cheiro teu. Não é de rosas, nem de qualquer tipo de flores. É suave, é doce, assemelha-se à pele de um bebé. Mas é totalmente diferente. É, ao mesmo tempo, leve e pesado. É forte, é teu, completamente teu, tão singular… quem me dera conseguir defini-lo numa só palavra.
Tens uma voz inconfundível. Ecoa nas minhas paredes sapiente, parece saber o lugar meu. É grossa e rouca. É forte e altiva, alumia-me, mas não é rude. É reconfortante. É apaziguadora. E quando me soa baixinho, como que em sussurro ou num murmúrio, morro num só momento. Perco-me completamente e faço-me ser da voz que oiço para que a guarde sempre em mim. É incrível como um único som pode ser tanta coisa e coisa nenhuma, pois ainda não encontrei uma palavra que a voz te defina.
O teu toque. Parece magia. Enfeitiça-me. Sinto-me em lugar nenhum que não sei determinar. Perco quaisquer noções de tempo e de espaço. Tens um toque aliciante. É carinhoso e rude, áspero e terno e esta dualidade faz-me ansiá-lo sempre. Queria defini-lo numa só palavra.
Sabes… Sabes a… não é nem morango, nem menta, é doce… mas não o é. Parece que contém acidez, mas não sabe a nada disso. Sabes a uma mistura de coisas agradáveis, rosa, jasmim, morango, uva, chocolate... chocolate! Com uma combinação de sabores ambíguos, como  a laranja, o limão, a malagueta, a pimenta, a hortelã… Alias o suave, o puro a um género de acidez, que nada tem a ver com o que é ácido, mas que o é ao mesmo tempo… Impossível! É impossível definir o teu sabor numa só palavra.
Palavras.
Palavras e palavras contraditórias e complementares.
Palavras e palavras que nada dizem. São todas elas burlescas. Nenhuma delas te define e no entanto tentei escrever-te em tantas.
Pelos vistos, não és literatura. As palavras não são, de todo, ricas afinal. Se nenhuma te consegue definir significa que o vocabulário não é suficientemente extenso. Muito pelo contrário, é risivelmente pequeno, é pobre.
Ou então és tu que és demasiado… Não sei.
Sei que sou fruto da essência toda que és e que não sei definir. Sei que me enfrasco do teu perfume e outro não desejo. Quero beber do teu sabor. Quero ouvir-te mais uma vez com aquela voz que me faz ir e voltar de um lugar que não sei. É teu, pois só tu me mandas para lá. Quero sentir-me observada por ti, que o teu olhar me percorra e nenhum outro. Quero sentir-te. Abraça-me.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Não

Não é cansada, é esgotada mesmo. 

Quero não me ser.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Nua

Enxuga-me as lágrimas. Não quero mais chorar. Não quero mais chorar por ti.
Amanhã o Sol nasce de novo e eu só quero dormir para não acordar.
Pensei que quando me vendesses as tuas palavras afáveis eu me entregava a ti e serias comigo. Mas sou apenas eu. Esquecida. Largada no meio do nada.
Nua… Levaste-me tudo.

Nock Nock

Oiço um nock nock na porta. O meu corpo paralisa como uma estátua.
Sinto um tremer, um calafrio preenche-me o corpo todo e sou pedra naquele momento.
Pensamentos vários, múltiplos em voos de vaivém atingem-me e sou alvo de deliberações que não quero, imagens que não quero ver, recordações das quais não quero lembrar. Tudo dói e me parte.
O meu corpo não é mais do que um frágil pedaço de vidro facilmente estilhaçado. Estou petrificada e, de fora, se me não denotam um único movimento.
Dizem que morri. Não correm para me socorrer porque sabem que há muito que estou morta…
O espírito!
Vê-se a léguas. Ela está desalmada. Não sente. É pedra!
O corpo serve-lhe apenas como um instrumento de construção, de onde fluem ideias onde a maioria delas podem ser realizadas...

Sonhos

São sonhos. São meros míseros sonhos. Aparentemente insignificantes, mas que se repetem e me deixam em nenhuma outra posição senão como se vivesse essa prospectiva. Como sendo real, difamadora, dolente e terrível… terrivelmente próxima.
Quanto mais se aproxima mais monstruosa se me mostra e mais eu me sinto perdida. E pior do que me perder de ti é perder-me de mim. Se estou contigo eu sou contigo, mas se não estou, também não sou simplesmente.
É estranho procurar certezas em sonhos que  mas não podem trazer. Todavia aquilo que sonho é tão possível que me faz duvidar de que não possa acontecer.
E se acontecer, que fazer?
Não sei.
Morro só de sonhar. Não quero, por nada, que o sonho perca as suas capacidades oníricas e me esmague, que me aprisione com o seu olhar vencedor uma ínfima formiga derrotada no meio deste mundo todo.
Não me considero capaz de enfrentar tal coisa e já estou tão balançada que é o vento que me orienta o rumo.
Não sei são, probabilisticamente, as palavras que mais vezes profiro. Vagamente. São tão soltas e sem qualquer conteúdo… são o ar que respiro, no qual me envolvo e me embriago.
Desisti de te perceber. Sou limitada e as minhas capacidades inatas mo não permitem.
Pena sentir. Mas nada mais ao meu alcance está que possa fazer. Não é mais meu dever ocupar-me de um só remo se o barco só avançará com os dois.
Se o que sonho noite após noite sair do seu mundo imaginário para o mundo cruel e real não creio que as minhas forças queiram mais lutar.
Cansei-me. Esgotaste-me.
Não importa se gostas, se não cuidas, se não queres proteger e viver cada minuto como se fosse o último.
Nada do que digas que sentes é relevante se não me deres aquele abraço, se não disseres que queres que seja tua, se não me adocicares com as tuas palavras que sempre tomei como cheias para me preencherem.
Evitas-me e canso-te. E por isso, sou eu agora que me anuncio como fatigada. Sou apenas um ínfima parte deste mundo e há tanta gente melhor.
Quero que sejas feliz e quero sê-lo também.
Se me não queres não desperdices o pouco valor que tenho.
Se o não queres deixa-me ao menos guardá-lo.
Eu amo-te.
Mas pelos vistos amar-te não chega.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Bate Tolo, Bate

Bate. Bate. Bate.
É tão veloz quando te sente.
Não se esquece.
“É teu amor
É tão real.”

Bate. Bate.
É por amor.
Infame e louco,
Docemente apaixonado.

Bate. Bate e deixa bater.
Bate por devaneios.
Bate por anseios
meus.
Bate por te ver.

Bate e vai cedendo.
Escravo, fiel, obediente.
Como que incansável e resistente.
E, até, dolente.

Bate. Bate. Bate.
Admirável é sua firmeza.
Denota-se ávido e ímpar.
Tolo. Nada sabe sobre o amor.

Bate tonto. Bate em vão.
Não percebe.
Mas bate. E como bate!
Animal feroz.
Ameaça – que é já de sua raça–,
Deitar garras em terreno inimigo.
Bate tão cegamente que mesmo vendo não vê.
Não vê ou finge.
Porque o não quer.

E bate. Bate e
Ouve a voz da consciência.
Finge ouvidos moucos.
Grita porque ama e quer bater.
Triste.
Porque sabe que por amar
Se vai perder.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Sempre

É um espírito grande e abrangente, concernente a toda a gente. Digo que, porém toda esta alacridade que se vive neste breve anual período de tempo, é um espírito profundamente sardónico.
Nem tudo é, contudo, pautado nem de alegria nem de ironia, mas tão-só de um discurso deveras loquaz do qual ninguém escapa impune.
Escrevo, portanto, por entre estas linhas lexicais, tudo menos a bela de uma crítica que visa a auto-destruição ou ver-me-ia mais do que uma louca a caminhar para o suicídio.
É, deste modo, sensato reflectir um pouco sobre os seres taciturnos que me rodeiam. São-no cientes de que o são, invadidos por uma felicidade precária e pouco ou nada elucidativa da verdadeira realidade.
O poema da minha vida é uma história deixada em aberto cujo seu desfecho nem lá de longe se avista. Entro neste espírito incongruente e finjo também um sorriso que é, no espelho, sensabor.
Sei, desde sempre, que o fingimento não se alia à Felicidade intrínseca – nunca. Talvez o fio condutor que por mim faz por passar não seja nada mais do que um vontade tremenda de querer acreditar ingenuamente na perpetuação desta alegria, para que as cores não sejam unicamente experienciadas nesta altura do ano, mas tão somente sempre.
E este sempre dá lugar a tudo o que é inefável. É uma palavra bastante robusta e muitas vezes aclamada sem qualquer noção. Temerária, de certo que também o é. A diferença entre a sua conotação positiva e negativa reside singularmente naquilo em que nos queremos fazer acreditar. Apesar de isto não passar de uma mera opinião, penso haver um pouco de luz nesta dúzia de palavras. Muitas vezes nós vestimo-nos das palavras que dizemos convincentes, ainda que pouco, e dissimulamos esse pensamento, para afastar a agonia da proximidade do futuro se tornar presente. Por isso muitas palavras, entre elas a que discuto de momento – o sempre – são interpretadas de diversas maneiras longe da sua verdadeira conotação na altura em que saem repentinas para fora da boca e que levam com as gélidas lufadas do ar do Inverno.
Tal como uns crêem num sempre risonho, também o invejo, mas estou deveras apartada. Contudo, a minha inutilidade faz-me, mesmo sabendo que não é real, acreditar em utopias. Tenho-me, na minha consideração, como uma pessoa bastante realista, todavia, alguns assuntos são tão absurdos que começo a duvidar dessas linhas que me definem.
Se os olhos já estão bem abertos porquê continuar a iludir-me? Não consigo entender por que é que consigo ser tão fraca neste aspecto, se tenho tudo para mostrar que tenho realmente valor. É verdade, tenho. Sempre o soube, no entanto, nem todos os momentos são iluminados e há tantos dias em que o meu orgulho se esconde debaixo da minha cama.
Hoje, pseudo-realista, encontro-me num dilema. A minha veia convicta da sua racionalidade, mostra-me que não sou pequena, muito pelo contrário, não obstante, a minha outra veia, aliada do sentimento, fraca e volátil, quer continuar a fingir que acredita naquilo que se distancia cada vez mais do meu futuro.
Se continuar a caminhar para este abismo, tudo o que já perdi posso nunca mais recuperar. Já pouco de mim detenho, por isso, apelo à minha inteligência que está escondida por detrás da ignorância para sair, para me fortalecer, para me deixar viver e sorrir sem medo.
Estas falsas ocasiões estão repletas de sorrisos amáveis que se deixam vender, confundindo-me. E porque quero que me confundam, para fingir que me iludo e sorrio também, fingindo-me feliz, cega pelo medo, incapacitada e desencorajada, perdida e sem nome nem direito, sequer, ao mesmo.
Não é preciso pedir castigo quando já se vive nele. 



P.S.: Uma das músicas mais fortes, na minha opinião.